http://www.pedro.jmrezende.com.br/sd.htm | Totalitarismo: o Estado eletrônico

Quando é importante controlar a produção de software

Prof. Pedro Antonio Dourado de Rezende
Departamento de Ciência da Computação
Universidade de Brasília
7 de dezembro de 2015


Num portal de notícias de TI, saiu hoje uma notícia de que o atual ministro da fazenda, Joaquim Levy, quer reduzir a presença do Serpro no mercado estatal de TI.

O que podemos encontrar como motivo e como consequências? Para tentar respostas, precisamos de perspectiva, e para isso, convido o leitor a visitar o atual cenário geopolítico global.

Após o recente plebiscito na Grécia, em julho de 2015, no qual venceu (com 62% dos votos) o repúdio à proposta de rolagem da dívida grega nos termos contabilizados pela troika (ECB, FMI e UE), por razões amplamente investigadas pelo parlamento grego que considerou tal dívida odiosa (ilegítima, entre outros motivos pelo fato da contabilidade estar repleta de fraudes e abusos), o governo de Tsipras acabou desistindo da consequência lógica dessa decisão popular -- que seria a de abandonar o Euro e fazer uma transição para nova versão de sua antiga moeda -- e terminou ignorando o resultado do plebiscito, por uma razão prática muito simples.

O problema não era falta de gráficas para imprimir novos dracmas. O problema é que toda a infraestrutura de TI para arrecadação fiscal do governo grego é controlada por um dos megabancos credores (se não me engano, o JP Morgan, conforme relatado pela analista financeira Catherine Austin-Fitts em entrevista ao portal "TF Metals Report"). Ficou fácil para a troika chantagear, com ameaça de sabotagem por asfixia ao governo Tsipras: o Estado grego não teria como arrecadar em sua nova moeda, e pronto: sem nenhuma autonomia sobre sua máquina arrecadatória, achou por bem ceder.

Quo Vadis?

Do ponto de vista financeiro, o Brasil está exatamente no mesmo caminho da Grécia, e Joaquim Levy é egresso do FMI. Ele reza a cartilha da mesma trupe de concentradores financeiros globais que hoje opera a recolonização da Grécia e da Ucrânia, cavalos de batalha no atual cenário geopolítico, e que aqui fincaram suas âncoras para isso em 1988. A missão de quem hoje ocupa nosso BC é levar o Brasil, sob a bandeira de uma teoria econômica hoje falida, pelo mesmo processo de desmonte gradual e completo da soberania nacional, rumo à nova forma de escravagismo econômico a ser completado com o reset financeiro que seguirá ao colapso do dólar.

Nesse roteiro (veja entrevista a respeito), para que as condições do Brasil de amanhã equivalham às da Grecia de hoje, o desmonte do Serpro deve seguir ao da Petrobrás, como indica a notícia citada. Inviabilizadas para serem entregues a preço de banana a operadores da trupe, com ajuda de vazamentos seletivos de escândalos administrativos, que caem no colo de um aparelho judicial cooptado e/ou operadores designados. Gentiliza do regime de vigilantismo global, com a mídia corporativa cumprindo fielmente seu papel na operação psicológica (psyop) correspondente, que tange e aplaina e a "opinião pública". É o modelo de guerra baseado em bancos centrais, testado e praticado há mais quase 500 anos.

Levy já derrubou o presidente do Serpro, mas Dilma logo o reconduziu, ao sentir cheiro de cilada. Depois que Dilma cair, fiquem portanto de olho no Serpro e sua joia da coroa, que é a base de TI da Receita Federal. Sobre o timing, contribuiu a decisão dela de co-fundar o banco de investimento do BRICS como alternativa ao FMI, em julho de 2014. E sobre o que isso tudo tem a ver com o cenário geopolítico atual, sua lógica e seu cínico descambo rumo à III Guerra Mundial -- ou sobre anzóis no queixo de Magog em Ezequiel 38 e 39 --, sugiro a leitura de um analista militar que aparenta ser norteamericano e que se pseudonimiza como "Saker": "The empire strikes back" (também traduzido)

Qual é o problema?

Aos que possam receber mal a sugestão, questionando se a atuação do PT dos últimos anos não teria nada a ver com a ação do Levy, ou se o motivo desse artigo não seria desviar a atenção das falcatruas dos petralhas e da turma do lava-jato com uma análise extremamente tendenciosa, peço permissão para explicar-me. O condão desta análise está em que, para se destruir um partido ou governo corrupto, não é necessário desmanchar o Estado que ele opera enquanto no poder, ao passo que, para se desmontar um Estado que defende sua soberania, ao contrário, é necessário destruir o governo que o opera e seu partido. Na última década, o Iraque, Afganistão, Líbia, Tunísia, Ucrânia e quem sabe Síria e Egito vem nos dando exemplos disso.

A intenção não é indicar o Levy e seus comparsas nas finanças globais como "o problema do Brasil." A intenção é indica-los como agentes da forma preferida -- e mais bem sucedida -- de exercício do poder político na nossa civilização pelos últimos 500 anos. Isso indico como fato, do qual Brasil e Levy são meros elementos, e não como problema. Se esta análise insinua problema, vejo-o no fato desta forma eficaz e preferida de exercício do poder vir nos empurrando, inexorável e ciclicamente, para a auto-destruição "criativa", conforme análise do economista e sociólogo Joseph Schumpeter em "Capitalism, Socialism and Democracy," e no projeto hegemônico de um governo tirânico global,que requer o desmonte em série de Estados-nação, de preferência executado pelos próprios povos afetados. Resta saber como a fila é controlada.

O problema então surge no fato desses ciclos virem apresentando uma escalada que aponta para a auto-destruição não mais apenas de nações, de sociedades organizadas ou de civilizações, mas eventualmente da espécie humana. Pois entre as atuais superpotências nucleares certamente haverá disputa pela última posição na fila do desmonte. Concordo que há tendenciosidade em minha análise, mas não no sentido de "defender o PT". Concordo que há, mas no sentido de escancarar o declínio moral de nossa sociedade, que me parece sui generis no atual ciclo de destruição criativa (onde estão as garantias de que o PSDB ou quem quer que seja será menos corrupto?), e de como esse declínio se encaixa com profecias bíblicas nas quais acredito.



Autor
Pedro Antônio Dourado de Rezende é matemático, professor de Ciência da Computação na Universidade de Brasília, Coordenador do Programa de Extensão em Criptografia e Segurança Computacional da UnB, ex-representante da sociedade civil no Comitê Gestor da Infra-estrutura de Chaves Públicas brasileira e ex-conselheiro da Free Software Foundation América Latina. (www.pedro.jmrezende.com.br/sd.php)
Direitos de autor:
Artigo publicado e distribuído sob licença Creative Commons (CC) NC-ND 2.5. Termos da licença em: creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/2.0/deed.pt