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A escolha pública pelo software livre

Jornal Valor Econômico, 26/06/03

SIMONE TATSCH E MIGUEL REALE JÚNIOR

Reproduzido com permissão do editor (conforme email em anexo)


"É preciso chamar a atenção para a necessidade de os Estados observarem a Lei de Licitações"

Nos últimos meses, observamos a promulgação de leis estaduais que obrigam a Administração Pública a dar preferência ao chamado software livre ou não proprietário. É o caso da Lei n° 7.411/02, do Espírito Santo, e da Lei n° 11.871/02, do Rio Grande do Sul. Encontram-se ainda tramitando projetos de leis idênticas no Paraná e no Mato Grosso do Sul. Assim, é de se questionar a razão dessas escolhas e se elas representam a proteção do interesse público.

Existe no mercado o que podemos chamar de software comercial e software livre. No primeiro tipo, identificamos os softwares que desde a sua criação são destinados ao comércio, sobre eles incidindo uma forte proteção autoral, ou seja, as suas licenças de uso são onerosas, o código-fonte não é aberto - embora, em alguns casos, ele possa vir a ser - e a sua distribuição e reprodução dependem de autorização expressa do titular dos direitos autorais.

Esse tipo de licenciamento visa à própria manutenção do aspecto comercial da criação de programas de computador, ou seja, essas limitações autorais têm por fim permitir justa e devida remuneração dos responsáveis pelo desenvolvimento do software. De fato, representam a base para a manutenção da indústria destinada ao desenvolvimento da informática no país.

O software livre teve origem nos campos universitários, sendo originariamente destinado à pesquisa científica, motivo pelo qual o tipo de licenciamento sobre ele criado é bastante flexível, sendo o código-fonte aberto, sua  distribuição e reprodução livres, o que gera, normalmente, a gratuidade da licença de uso, embora essa não seja uma característica necessária desses programas. Por essas razões, eles são chamados de software livre.

Pretendia-se, quando da sua idealização, que, criado um software, fosse o mesmo disponibilizado para evoluir com acréscimos, tornando-se uma obra coletiva em contínuo aprimoramento, com marcado caráter solidário. Embora o caráter solidário dos softwares livres e os baixos custos de aquisição sejam elementos que os tornam, aparentemente, mais atrativos do que os softwares comerciais, antes que o setor público faça uma escolha por meio de lei, é necessária maior reflexão, tanto do ponto de vista fático quanto jurídico.

Previamente a uma tomada de posição, deve ser ressaltado que os softwares comerciais são criados para o consumidor. Assim, há pesquisa das demandas do usuário final, o que torna esses programas, normalmente, mais fáceis de usar e compatíveis com uma infinidade de outros. Além disso, quando se adquire uma licença de uso, há uma empresa responsável pela garantia e suporte. Com isso, os custos da aquisição inicial do software tendem a ser mais altos, mas as despesas com manutenção e treinamento tendem a ser baixas.

Por outro lado, o software livre tem um viés acadêmico, ou seja, a preocupação de seus desenvolvedores não é, necessariamente, com a facilidade de uso ou com as necessidades do usuário final, mas sim com a excelência tecnológica. Tendo em vista a diversidade permitida pela alteração do código-fonte, a compatibilidade com outros programas tende a ser reduzida.

Ademais, sendo o software livre uma obra, praticamente, coletiva, com a alteração do código-fonte, a responsabilidade e a garantia pelo produto restam afastadas. Por isso, embora os custos de aquisição sejam baixos ou quase inexistentes, são altos os custos com treinamento e manutenção. Percebe-se que ambos tipos de software apresentam vantagens e desvantagens, as quais, em cada caso concreto, deverão ser analisadas, permitindo uma melhor escolha, inclusive financeira.

Do ponto de vista jurídico também merecem críticas as leis mencionadas. É preciso chamar a atenção para a necessidade de os Estados observarem o que dispõe a Lei de Licitações (Lei nº 8.666/93), que é lei nacional e geral, em especial o que dispõe o seu artigo 3º, segundo o qual a licitação visa garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração Pública.

Além do mais, fazer uma escolha prévia, por um ou outro tipo de software, sem considerar as peculiaridades de cada caso concreto de compra a ser feita, representa afronta ao princípio constitucional da impessoalidade. É mister ressaltar ainda que as leis que tratam desse tipo de matéria, tendo em vista o princípio da separação dos poderes, são de iniciativa dos governadores, e não das Assembléias Legislativas, como no Rio Grande do Sul e no Espírito Santo.

Portanto, estabelecer alguma preferência ou escolha por uma ou outra forma de software por meio de lei, de forma genérica e para todos os casos, representa sério risco de danos à Administração Pública, além de constituir afronta ao princípio da impessoalidade. Considerando que já há uma lei nacional que trata das licitações e que determina a observância do que for mais vantajoso à Administração Pública, percebe-se que essas iniciativas legislativas baseiam-se mais em decisões emocionais. As escolhas públicas não devem ser emocionais ou ideológicas, mas sim racionais e prudentes.

Miguel Reale Júnior e Simone Tatsch são, respectivamente, ex-ministro da Justiça e sócio do Reale Advogados Associados e doutoranda em direito econômico pela Universidade de São Paulo (USP) e sócia do  Martins-Costa e Tatsch Advocacia
 

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Pedido de publicação de resposta ao valor economico
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-----Mensagem original-----
De: pedro a d rezende [mailto:rezende@cic.unb.br]
Enviada em: sábado, 2 de agosto de 2003 01:14
Para: [...]@valor.com.br
Assunto: Ref. Artigo de 26 de junho
 

Senhora editora de Opinião do jornal Valor Econômico,

Em 26 de junho o jornal Valor Econômico publicou artigo de Simone Tatsch e Miguel Reale Júnior, comentando potenciais conflitos entre o ordenamento jurídico vigente e a política de informática para a administração  pública do atual governo federal.

O referido artigo apresenta graves distorções conceituais e fatuais relativas aos elementos de tal política, que não podem quedar obscurecidas sem atingir a qualidade do jornalismo brasileiro. Quer do publico em geral, quer principalmente dos valorosos leitores desse importante jornal, em especial os do referido artigo.

Sou membro ativo da academia na área da Ciência da Computação, contribuinte regular para TI em vários jornais e portais web, incluindo o Jornal do Commercio e Jornal do Brasil do Rio, mas o que me move a contactar-lhe é outra responsabilidade: represento a sociedade civil no comitê gestor da ICP-Brasil, órgão normativo que responde pelo aspecto da segurança nas práticas sociais afetas a tal política, nomeado pelo presidente da república em 4 de abril corrente.

Nesta função, vejo-me no direito e no dever de oferecer uma segunda opinião sobre o tema abordado naquele artigo. Para isto, redigi e assino artigo em resposta, que tomo a liberdade de enviar-lhe em anexo, em formato html, de mesmo tamanho daquele artigo (~5400 toques, incluindo espaços), e que ofereço inicialmente para publicação no mesmo espaço em que foi publicado aquele. Gostaria de saber do interesse ou desinteresse do jornal Valor Economico em publicá-lo em tempo razoável.

Outrossim, informo já ter procurado o repórter do jornal valor econômico que cobre as atividades da ICP-Brasil, Rodrigo Bittar, em 10 de julho em Brasília, pedindo-lhe que intermediasse esta oferta, enviado a ele uma versão preliminar do meu artigo em 12 de julho, sem ter dele, ou do seu jornal, obtido qualquer retorno até o presente.

Coloco-me à disposição para quaisquer esclarecimentos.

No aguardo,

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Resposta do valor economico ao pedido de publicação de resposta ao artigo acima
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-------- Original Message --------
Subject: Valor Econômico
Date: Mon, 4 Aug 2003 17:40:31 -0300
From: [editora de legislação e tributos ] <....@valor.com.br>
To: 'rezende@cic.unb.br' <rezende@cic.unb.br>

Caro Dr. Pedro Rezende,

O artigo a que o sr. se refere foi publicado no caderno de Legislação & Tributos, editado por mim.
Em princípio, gostaria de esclarecer que não publicamos artigos em resposta a outro artigo já publicado. Por este motivo, não poderemos publicar seu artigo, uma vez que ele, durante todo o texto, remete ao artigo anterior. O leitor que não acompanha todas as edições do caderno certamente ficaria confuso.

Todavia, gostaríamos sim de contar com a sua colaboração na seção de artigos, desde que o material - que deve ser inédito e dentro do padrão de 4.000 a 5.000 caracteres, incluindo espaços - defenda o seu ponto de
vista como representante da sociedade civil no comitê gestor da ICP-Brasil em relação ao assunto, sem remeter a
qualquer outro material já publicado.

Atenciosamente,
[ editoria de legislação e tributos ]
 

[...]
Editora-assistente de Legislação & Tributos
Valor Econômico
 
 

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Pedido de publicação espelhada do artigo acima
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-----Mensagem original-----
De: pedro a d rezende [mailto:rezende@cic.unb.br]
Enviada em: segunda-feira, 4 de agosto de 2003 18:50
Para: [...] editoria de Legislação e Tributos
Assunto: Re: Valor Econômico
 

Agradeço o convite. Neste caso, preciso de sua permissão para replicar, em sua íntegra, o artigo supracitado, para fazer-lhe resposta em meu próprio site.

Respeitosamente,

Pedro A. D. Rezende
 

-------- Original Message --------
Subject: RES: Valor Econômico
Date: Mon, 4 Aug 2003 18:50:18 -0300
From: [editoria de Legislação e Tributos <...@valor.com.br>
To: 'pedro a d rezende' <rezende@cic.unb.br>

Caro leitor,

Os artigos publicados no Valor Econômico podem ser reproduzidos desde que
citada a fonte.

Atenciosamente,

[...] editoria de Legislação e Tributos