http://www.pedro.jmrezende.com.br/sd.php > virus e malware: spam

Debate sobre spam

Prof. Pedro Antonio Dourado de Rezende
Departamento de Ciência da Computação
Universidade de Brasília
Abril e maio de 1999
 


Em Abril de 1999, o professor recebeu uma mensagem não solicitada com teor comercial e engajou-se com o spammer num debate sobre direitos e responsabilidades na internet. Solicitou que os alunos comentassem sobre os argumentos usados no debate. O texto abaixo é o debate com o spammer, seguido de um debate com um dos alunos da turma 1/99, sobre os argumentos aqui empregados.
[25/04/99] 

CONDINFO@aol.com wrote:

[BLA BLA BLA...] marketing. Se por alguma razão este assédio lhe incomodar ou se esta informação não for do seu menor interesse, por favor nos desculpe. Nos faça a gentileza de se comunicar comnosco que prontamente seu eMail será ZAPeado do nosso cadastro cinco estrelas.

Atenciosamente,
JRO Software International

Nunca autorizei nem nunca irei autorizar ninguem a divulgar meu email para fins marqueteiros. Solicito que meu e-mail seja removido de sua lista e das distribuições desta lista a terceiros, pelas "algumas razões" descritas abaixo. 

O envio de email comercial nao solicitado, principalmente para uma rede universitaria, é antietico, intrusivo e abusivo, pois consome recursos computacionais do destinatario sem sua autorização, consentimento ou anuencia, e em larga escala resulta em perdas de tempo e banda passante significativas, sendo que no meu caso provoca o efeito contrario ao desejado pelo spammer, o de memorização positiva da marca divulgada. 

Caso receba outros spams de seu endereço, tomarei providencias para solicitar a seu provedor o cancelamento de sua conta, e caso nao seja atendido, para filtrar o trafego deste provedor para minha rede e divulgar o conluio entre spammer e provedor para as listas de discussao antispamming do Brasil  --

[26/04/99] 

Prezado Professor Pedro A D Rezende,

Confirma-mos a retirada do seu eMail do nosso cadastro VIP. Sorry. 

Sua reação negativa à nossa mensagem comercial contém um teor de rejeição acima do normal. Nos permita algumas ponderações. Pedimos a sua autorização para mantê-lo no nosso cadastro cinco estrelas. Respeitamos a sua opinião, achamos justo pedir que o Senhor respeite a nossa. Será que é do seu conhecimento que a sua opinião caracteriza uma minúscula minoria dos que recebem o nosso eMail convite para visitar o nosso web site? Para ser exato,  apenas 0,7% dos endereçados pedem a retirada do seu eMail. Em comparação, 15-20% dos eMails enviados por nós retornam por que o destinatário é desconhecido (seu eMail foi cancelado, temos informações incorretas etc). 

O Brasil está se informatizando e existe um grande interesse, especialmente por parte dos jovens, em participar deste processo. Através do nosso eMail convite, o nosso web site é visitado por centenas de Internautas toda semana. O volume de dados transferidos via nossa versão demonstração gira em torno de um gigabyte por mes. O nosso software é de grande interesse por que utiliza os recursos da informática para melhorar o convívio humano neste aglomerado complexo, o condomínio, que caracteriza as grandes cidades brasileiras. O nosso relatório mensal começa com um sumário: Total recebido, total de despesas, disponível em banco etc. A conta bancária é individual por condomínio. É crescente o número de condôminos que  se cansaram de relatórios ininteligíveis, extensos  e mal diagramados, sem o apoio de recursos gráficos (o nosso software imprime um gráfico para qualquer conta com dados dos últimos cinco anos), onde o valor das multas pagas some misteriosamente, onde os valores pagos em atraso desaparecem, onde juros e correção monetária sobre as aplicações inexiste etc etc. Acredite que temos conhecimento de causa. Utilizamos a Internet para exemplificar como funciona o nosso software. Tudo isto a um CUSTO ZERO! Basta aceitar o nosso eMail convite! É por isso que uma maioria esmagadora apoia o nosso trabalho. Os nossos clientes nos admiram e nos recomendam. 

Seu eMail se esforça em aumentar o nosso pecado em lhe enviar um simples convite por ter sido irecionado a uma comunidade universitária. Mais uma vez peço desculpas pelo mal não intencional, apenas peço, utilizando as suas palavras, que o Senhor se penitencie em ler "algumas razões" pelas quais o fazemos. Tenho dois diplomas universitários. Ambos foram conquistados a duras penas com o apoio de duas bolsas integrais. A ultima foi custeada pela Câmara de Comércio Americana de São Paulo via Comissão Fulbright aí de Brasília. O intuito do programa da Câmara foi o de transferir tecnologia para o Brasil. Até hoje me esforço em cumprir tão elevado ideal. O meu software é um exemplo vivo deste objetivo devido a sua complexidade, beleza conceitual e facilidade de utilização. 

Recentemente fundei uma companhia aqui na California chamada Art of Programming com o intuito de atender o mercado local de banco de dados relacionais em ambientes de rede e também para adaptar software e tecnologias emergentes para o mercado brasileiro. Devo o que conquistei na vida aos meus Professores. Sempre me emocionei com idéias e ideais. Dedico o software Condomínio Informatizado aos meus professores, com admiração. Quando envio o nosso convite aos professores e universitários em geral o faço pela missão que devem cumprir: tirar os brasileiros, macunaímas afáveis, do seu marasmo intelectual e servil. Os agiotas estão soltos no terceiro mundo, os funcionários públicos meia porção incham as despesas do setor improdutivo da nossa economia, qualquer petelho ignorante, palhaço de palanque, consegue se candidatar a presidência. Eu tenho VERGONHA! Professores, pelo amor ao nosso país, exerçam conscientemente a profissão mais nobre de todas, para evitar que as décadas perdidas se sucedam no Brasil! Os nossos jovens merecem muito mais. 

Não dignificarei as suas ameaças finais "tomarei providências..." com nenhum comentário da minha parte. As condeno com o meu silêncio e desprêzo. Enfim, caso esta troca de idéias tenha surtido algum interesse em continuar o nosso contato, peço a sua anuência da sua sensibilidade tão excitável, para lhe mandar uma amostra grátis do nosso manual, totalmente diagramado a cores, onde estão documentadas todas as telas projetadas e todos os relatórios do sistema. 

Finalizo dizendo que, devido ao alto número de clientes que precisamos atender e a correspondência que precisamos manter com tantas cidades brasileiras, não é nosso hábito responder pessoalmente como no seu caso. O fizemos tão somente em respeito a sua  Profissão. Em seguida reproduzimos a carta padrão que mandamos para aqueles que acreditam terem recebido um atentado à sua felicidade quando lhes enviamos o nosso eMail convite. 

<<<  X >>> 

Agradecemos a sua resposta ao nosso eMail. Conforme a sua vontade, estamos retirando o seu eMail do nosso cadastro cinco estrelas imediatamente. 

Nos permita a tecer algumas considerações sobre a sua opinião de que mandar eMail não solicitado não é ético. DISCORDAMOS. E o fazemos pela experiência que temos neste assunto. Não concordamos com opiniões pré-concebidas, presunçosas e mal intencionadas. Em primeiro lugar, o eMail enviado lhe pede sua anuência. Em seguida, e são tantas as razões, que todos os Webmasters deveriam observá-las como se fossem palavras da Bíblia, mantemos estatísticas da nossa correspondência, e uma pequeníssima fração das pessoas tem objeções como a sua. Para ser exato, de toda correspondência que mandamos, apenas 0,7% não querem mais permanecer no nosso cadastro, no que são prontamente atendidas. As nossa mensagens se referem a um software de altíssimo padrão que melhora o fluxo de informação de milhares de condomínios, aumentando a qualidade de vida; não se trata de um web site pornográfico, venda de alguma geringonça moderna etc. Os nossos clientes admiram e recomendam o nosso trabalho. 

O marketing das sociedades modernas não pede permissão para entrar em nossas casas. Embora concordamos que possa representar um transtorno para algumas pessoas, ressaltamos também que a propaganda dissemina informações úteis, ativa o ciclo de produção e consumo, gerando empregos e dignificando a condição humana. Todos os provedores da Internet veiculam banners, chamadas para web sites, oferecem produtos e serviços e atuam de uma maneira altamente produtiva utilizando a Internet como um recurso maravilhoso da comunicação moderna e, entre outras coisas, aproximando vendedores e compradores. Não sejamos hipócritas aplicando dois pesos e duas medidas. Eu recebo, e nunca solicitei nenhuma dessas formas de marketing. Posso até me sentir incomodado em alguns casos, mas NUNCA chamaria isto de anti-ético! Acho que é um tipo de comunicação cujo momento se manifesta hoje. 

Podemos aumentar esta lista de considerações ad nauseum e, sempre com razão, mas gostaríamos de finalizar com uma última consideração. Existem muitas objeções de Webmasters que ainda não se conscientizaram de sua verdadeira missão de circular informações, uma missão que está no coração da palavra comunicação. Existem Webmasters que devido ao seu equipamento sub-dimensionado e sub-capitalizado, exercem a odiosa prática Nazista de confiscar a correspondência alheia, sob os seus pretextos míopes, negando ao destinatário final o direito sagrado de abrir suas cartas. Não nos confunda com amadores, temos conhecimento de causa, em especial em informática, um campo onde atuamos por quase 30 anos. 

Enfim, se lhe convier, visite o nosso web site, <A HREF= [ snip ] </A> (letras minúsculas), mas primeiro, abra o seu coração, eleve a sua alma para poder apreciar a beleza de um software esmerado e bem feito, e junte-se a nós no esfôrço de difundir os benefícios da informática no convívio do dia a dia. E não se iluda, mesmo não manifestando nenhum interesse pelo que temos a oferecer, sabemos que isto faz parte de uma realidade maior que precisamos respeitar. 

Atenciosamente,

[26/04/99] 

Prezado sr, 

Desde que a forma empregada para obter meu email tenha sido legítima, e desde que meu email nao seja usado em redistribuição do seu cadastro ou para spamear-me, (enviar-me email comercial nao solicitado), respeitarei sua opinião, apesar de nao ter a menor ideia do que significa e para que serve seu cadastro cinco estrelas.

Entendo e espero que sua proclamação de respeito à minha opinião signifique respeito ao meu desejo de não receber email comercial nao solicitado.

Será que é do seu conhecimento que a sua opinião caracteriza uma minúscula minoria dos que recebem o nosso eMail convite para visitar o nosso web site? Para ser exato,  apenas 0,7% dos endereçados pedem a retirada do seu eMail.
Trata-se de banalização mercadologica e marqueteira, querer nos fazer crer que o desejo ou curiosidade ou preferência da maioria, por maior que seja a maioria, por este ou outros tipos de conveniência, novidade ou frivolidade, constitui sansão democrática e aval cultural à perpetuação de nossa crescente exposição coletiva ao risco de sermos tomados como objetos ou agentes, involuntarios, indiretos ou cooptados, de fantasias e visões de mundo alheias. A menos que me convençam do contrario por outros meios, continuarei a ter a mesma opinião sobre os direitos de privacidade e livre escolha que julgo deter no estado de direito em que supostamente vivemos, e que sinto-me no dever de reclamar sempre que entendê-los violados.
Em comparação, 15-20% dos eMails enviados por nós retornam por que o destinatário é desconhecido (seu eMail foi cancelado, temos informações incorretas, etc). O Brasil está se informatizando e existe um grande interesse, especialmente por parte dos jovens, em participar deste processo. Através do  nosso eMail convite, o nosso web site é visitado por centenas Internautas toda semana. O volume de dados transferidos
Não classifico um email com convite para visitar sites como comercial. Isto não é considerado abusivo pela maioria dos que se preocupam com o assunto. Não é deste tipo de convite que estou falando (considero esta nossa correspondência valiosa, pois esclarecedora). 

O seu email não solicitado estava, outrossim, anunciando produtos ou serviços comerciais. Não é por aí que o comercio eletrônico (em cujo desenvolvimento técnico estou particualrmente envolvido) irá evoluir. Por favor, entenda o que está em jogo: se vc tivesse que pagar para me enviar seu anuncio, como na panfletagem de papel do mundo da vida, nao me sentiria no direito de tentar impedi-lo, pois vc estaria me *dando* algo (eu poderia, por exemplo, reciclar o papel). No entanto, não lhe custa pratimamente nada disparar automaticamente milhares de emails de sua maquina, e quando milhares de spammers estiverem fazendo o mesmo com o meu email, terei que gastar muito tempo, disco da minha máquina e banda passante da minha rede, para poder alcancar, na minha propria caixa postal virtual, a correspondencia que me interessa e da qual depende a eficiência do MEU TRABALHO. Como o conteudo do spam é algo que POR PRINCIPIO E DEFINITIVAMENTE não me interessa, vc estará assim me *subtraindo* de algo que me é valioso, principalmente meu tempo. 

Nenhuma racionalização estatística do problema, tal como o "argumento da maioria" (por vc acima empregado), ou o "argumento do grau de intensidade", irá obscurecer a lógica do raciocinio exposto acima ou abalar a minha covicção sobre o assunto, formada através de minha posição profissional, que exige de mim um esforço constante de leitura global da evolução da informática, aqui e no mundo. Não é por que um furto foi de apenas 5 centavos, que o ato deixa de ser furto. Considero meu dever apontar aos alunos as questões na dimensão ética e cívica das transformações que sofre a sociedade pela evolução da informática, e em minha opinião (posso ser um formador de opinião), como tambem na de varios juristas, a questão do spam se insere na questão dos direitos de uso de recursos urbanos e privados. 

Este é o principio no qual se baseia a oposição ao spam: eu, e quem mais se opõe ao spamming, quero que sejam respeitados os meus criterios para uso de recursos da minha maquina, por motivos que considero justos e que remetem a meus direitos no mundo da vida. Por princípio, nunca irei fazer negocio com nenhuma empresa que ignore e desrespeite este direito que julgo ter, por razões de coerencia. Respeito seu direito de buscar novas formas de usar a tecnologia da informacao para fazer comercio, e até participo desta busca, mas desde que os metodos empregados nao violem os direitos que julgo ter sobre meus proprios recursos computacionais, e que a vc podem parecer insignificantes ou virtuais. 

Quem defende o spam usa 2 pesos e 2 medidas, beneficiando-se do custo ínfimo da opção virtual do marketing enquanto ignora os direitos virtuais do seus potenciais consumidores. O mundo virtual da internet nos traz desafios de compreesão de antigos conceitos, onde vários argumentos estatísticos se tornam falaciosos: imagine se vc terá a mesma opinião de hoje sobre seu instrumento de marketing, quando tiver que abrir mais de 600 emails contendo atachments que podem carregar animações (ou virus de macro), correntes da felicidade e o escambau, para ter acesso a duas ou tres respostas de seus clientes... 

Os grupos de defesa anti-spam tambem estao em busca de novas formas de uso da tecnologia para fazer valer seus direitos de privacidade, de liberdade, e de proteção contra poluição no dilúvio de informações do mundo virtual, devendo ser de seu conhecimento que nos últimos 12 meses, legislação anti-spam tem sido aprovada em varios estados americanos, incluindo na California, onde "surgiu" a internet (onde foram desenvolvidos os primeiros algoritmos de roteamento usados pelo IP). 

Deve ser também de seu conhecimento que hoje nos EUA todo provedor é obrigado, para poder ter acesso à maioria dos serviços de backbone disponíveis, a divulgar o seu "statement policy", onde estão listados direitos e deveres dos assinantes de suas contas. A maioria dos provedores americanos (como creio ser o caso da AOL) tem, em sua statement policy, clausulas que limitam os direitos dos assinantes de usarem suas contas para enviar emails comerciais nao solicitados, principalmente se os servidores de linha discada se hospedam em estados onde este tipo de atividade é restrita por lei. 

[...Snip...]

Quando envio o nosso convite aos professores e universitários em geral o faço pela missão que devem cumprir: tirar os brasileiros, macunaímas afáveis, do seu marasmo intelectual e servil. Os agiotas estão soltos no terceiro mundo, os funcionários públicos meia porção incham as despesas do setor improdutivo da nossa economia, qualquer petelho ignorante, palhaço de palanque, consegue se candidatar a presidência. Eu tenho VERGONHA!

Professores, pelo amor ao nosso país, exerçam conscientemente a profissão mais nobre de todas, para evitar que as décadas perdidas se sucedam no Brasil! Os nossos jovens merecem muito mais.

Congratulo e compartilho de sua preocupação e senso de missão. Apenas discordo dos metodos.
Não dignificarei as suas ameaças finais "tomarei providências..." com nenhum comentário da minha parte. As condeno com o meu silêncio e desprêzo.
Se seu desprezo for materializado na forma de ausencia de email comercial não solicitado em minha caixa postal de sua parte, será recebido com gratidão e respeito.
Enfim, caso esta troca de idéias tenha surtido algum interesse em continuar o nosso contato, peço a sua anuência da sua sensibilidade tão excitável,
Assim podem ser os humanos. Por serem excitaveis, podem tambem ser sensiveis.
...lhe mandar uma amostra grátis do nosso manual, totalmente diagramado a cores,
Agradeço mas declino.
[...snip...] O marketing das sociedades modernas não pede permissão para entrar em nossas casas.
Mas pede a anuência. 

O ato de comprar um jornal, ligar e sintonizar o aparelho de televisão, ou pendurar uma caixa de correspondencia com o portinhola acessivel aos passantes na calçada de minha casa, constitui anunência. Caso o endereço de email tenha sido legitimamente obtido, a divulgação do email constitui anuência.

[...snip...] Nos permita a tecer algumas considerações sobre a sua opinião de que  mandar eMail não solicitado não é ético. DISCORDAMOS. E o fazemos pela experiência que temos neste assunto. Não concordamos com opiniões pré-concebidas, presunçosas e mal intencionadas. Em primeiro lugar, o eMail enviado lhe pede sua anuência
O ato de interromper um interlocutor (ato perlocucionario) para lhe pedir autorização (ato ilocucionario) para ser interrompido e ouvir (ato locucionario), já é, EM SI, um ato de interrupção. Assim, este ato ilocucionario (o pedido) visando o sucesso do ato locucionario (ser ouvido) esvazia-se de sentido caso seja executado EM CONTINUIDADE com o ato locucionário pretensamente autorizável (a audição pedida), isto é, dentro do mesmo ato perlocucionario (da mesma interrupção).

Atribuir significado à solicitação de autorização em um tal ato perlocucionário constitui paradoxo da linguagem, explorado pelos sofistas e denunciado por Aristoteles ha mais de 2000 anos, no berço de nossa civilização. Paradaxos surgem do uso indevido de construções semânticas em uma linguagem humana. Não sabemos detectar muito bem a contribuição dos sofistas à nossa civilização, mas a de Aristoteles materializou-se eventualmente na ciencia moderna. Sustitua no paragrafo acima a palavra "interromper" pela expressão "usar seus recursos computacionais" e releia, para perceber a falácia do seu pedido de autorização, invariavelmente utilizado pelos spammers para se defenderem de acusações de intrusão.

A msg que respondo por exemplo, assim como esta, tem conteudo de valor comercial, PORÉM foi solicitada e implicitamente autorizada pela prática social da comunicação linguistica, pois responde a menagem que lhe enviei. Somente a primeira msg se enquadra na definição comum de spam, pois omite a fonte do endereço destinatário em mensagem eletrônica comercial não solicitada. Não houve uma solicitação de autorização para usar recursos de minha  maquina para aunciar um produto e, DEPOIS DE AUTORIZADO, o anúncio enviado. Ouve apenas um email, que solicitava o uso de meus recursos computacionais para atingir tal fim e que já o atingia, que pedia para fazer e fazia, tudo ao mesmo tempo sem chance de ouvir qual fosse a resposta. Tal pedido é portanto uma farsa, e já que a hipocrisia foi mencionada, observe que voce mesmo, nela mesma, qualifica tal mensagem como assédio.

Em seguida, e são tantas as razões, que todos os Webmasters deveriam observá-las como se fossem palavras da Bíblia, mantemos estatísticas da nossa correspondência, e uma pequeníssima fração das pessoas tem objeções como a sua. Para ser exato, de toda correspondência que mandamos, apenas 0,7% não querem mais permanecer no nosso cadastro, no que são prontamente atendidas. As nossas mensagens se referem a um software de altíssimo padrão que melhora o fluxo de informação de milhares de condomínios, aumentando a qualidade de vida; não se trata de um web site pornográfico, venda de alguma geringonça moderna etc. Os nossos clientes admiram e recomendam o nosso trabalho. O marketing das sociedades modernas não pede permissão para entrar em nossas casas. Embora concordamos que possa representar um transtorno para algumas pessoas, ressaltamos também que a propaganda dissemina informações úteis, ativa o ciclo de produção e consumo, gerando empregos e dignificando a condição humana. Todos os provedores da  Internet veiculam banners, chamadas para web sites, oferecem produtos e serviços e atuam de uma maneira altamente produtiva utilizando a Internet como um recurso maravilhoso da comunicação moderna e, entre outras coisas, aproximando vendedores e compradores. Não sejamos hipócritas aplicando dois pesos e duas medidas. Eu recebo, e nunca solicitei nenhuma dessas formas de marketing. Posso até me sentir incomodado em alguns casos, mas NUNCA chamaria isto de anti-ético! Acho que é um tipo de comunicação cujo momento se manifesta hoje. Podemos aumentar esta lista de considerações ad nauseum e, sempre com razão, mas gostaríamos de finalizar com uma última consideração.
Há aqui muitas nuanças, mas peso e medida unicos, sob minha óptica: a medida da INICIATIVA. 

O serviço HTTP sobre IP é iniciado pelo browser, e portanto, a visita a uma pagina é de iniciativa do usuario do browser (ou de scripts de páginas previamente visitadas pelo usuário), que constitui ato de intenção de exame de conteudo. Convenhamos que um ato de intenção, intersubjetivamente compreendido, pode legitimamente ser interpretado como ato de autorização de sua consecução. Em outras palavras, o clicar no browser pressupõe anuência, igualmente compreendida como tal por ambos cliente e servidor, para o recebimento do conteudo APONTADO, qualquer que seja este conteudo. 

O serviço SMTP sobre IP é inciado por qualquer agente MTI. Se a mensagem é nao solicitada *E* (AND, *not* OR) contem valor comercial, onde nao é anunciada a forma de obtenção do endereço de email destinatário, enviada *POR INICIATIVA* do remetente (pois teve a iniciativa material de obter o endereço E enviar a mesagem), ela pode, pela conjugação dos tres fatores acima, ser considerada anti-ética, devido justamente aos dois pesos e duas medidas anunciadas acima: 

Mas mesmo que possamos pesar diferentemente seus direitos e os meus, que tipo de argumento é usado para provar a insignificância dos meus custos, cujos direitos de evitar estão em questão? Argumentos estatísticos que se evaporam com a generalização, quando todos os marqueteiros do custo infimo fizerem valer os seus "direitos" de enviar email nao solicitado em massa! Apenas 0,7% dos cidadãos reclamam de spam, portanto, vamos proclamar tais "inconvenientes" como efeitos colaterais de se estar plugado no mundo moderno, e vamos quem quiser spamear!!! Uma logica tortuosa e falaz, como a do pedido de autorização para se comunicar veiculado na comunicação, como a de se substituir PASSA por CABE no ditado "Onde passa um boi, passa uma boiada". 
Existem muitas objeções de Webmasters que ainda não se conscientizaram de sua verdadeira missão de circular informações, uma missão que está no coração da palavra comunicação. 
Existem também legisladores que interpretam os direitos de cidadãos comuns na forma de legislação anti-spamming.
Existem Webmasters que devido ao seu equipamento sub-dimensionado e sub-capitalizado, exercem a odiosa prática Nazista de confiscar a correspondência alheia, sob os seus pretextos míopes, negando ao destinatário final o direito sagrado de abrir suas cartas. Não nos confunda com amadores, temos conhecimento de causa, 
Devem tambem ter conhecimento da legislação anti-spamming em vigor na California; Nazista ou não, odiosa ou não.

[27/04/99] 

Agradeço as suas ponderações mais objetivas. Os seus argumentos são totalmente válidos em relação as suas preferências. Respeito mas não concordo, principalmente quando a maioria dos nossos endereçados, tendo a opção de serem retirados do nosso cadastro, não o fazem. Pelo contrário, a maioria esmagadora, atraída pelo valor do que oferecemos, visita o nosso web site e, numa prova de confiança na idoneidade dos nossos princípios e metas, baixa o nosso demo. Se eu tivesse um mínimo de maldade no que eu faço, por ser também um programador em Assembler, poderia aproveitar esta confiança para inocular qualquer virus de minha preferência; é facílimo, tão fácil que não admito programas de terceiros na minha máquina, tamanho é o meu medo de ser aproveitado para circular um virus. Nem penso nessa possibilidade, já que para mim, simplesmente pensar nisso já seria um ato imperdoável. Não optaríamos por divulgar o nosso software pela Internet se o índice de rejeição fosse muito alto, ou se o que temos a oferecer não merecesse os elogios de São Pedro. 

As sociedades precisam examinar cuidadosamente as implicações comerciais da Internet, que são verdadeiramente revolucionárias. A comunicação barata pode ser efetuada em frações de segundos de e para qualquer parte do mundo, a qualquer hora. Me encontro em Los Angeles, nosso servidor está em São Francisco e os clientes em qualquer cidade do Brasil podem receber 24 horas, 7 dias por semana a nossa versão demo, com todas as telas e relatórios inteiramente grátis! 

As objeções ao "mass mailing" são muitas. As mais insignificantes (de menor número) são as de cunho pessoal como a sua. As objeções maiores são de cunho econômico. Não me venham convencer com o bla bla blá "anti-ético". Os provedores, principalmente os sub-dimensionados e sub-capitalizados, querem veicular apenas os seus anúncios nas suas chamadas, banners etc. Não percebem a sua missão mais ampla de circular informações cuja quantidade é progressivamente exponencial. Não admitem que os seus usuários possam ter interesses comerciais pelo preço da manutenção mensal de suas contas. É infantil, é hipócrita, é irrealista, é um Internauta troglodita, é nocivo quem quer enquadrar os usuários apenas como compradores, negando demagógicamente os seus direitos de anunciar como vendedores os seus bens e serviços. Não forçamos ninguém a aceitar as nossas opiniões, apenas insistimos no nosso direito de apresentá-las. 

Enfim, não se preocupe com o seu eMail, ele foi "flagged" no nosso banco de dados como inutilizável para os nossos convites penta estrelados para visitar o nosso web site. Não revendemos a nossa lista, não efetuamos trocas etc. Nos referimos a ela como sendo cinco estrelas por que nos esforçamos em captar eMails que se enquadram nas categorias que tradicionalmente mostram interesse pelo que temos a oferecer (professores de informática (com louvor), estudantes prestes a entrarem no mercado de trabalho, administradoras, imobiliárias, SECOVIs, SENACs, SEBRAEs etc).

Atenciosamente, 
JRO

PS: As minhas palavras embora incisivas, nem sempre fazem justiça à minha personalidade comunicativa e cordial. NUNCA MAIS lhe convidarei a visitar o nosso web site, mas, se num momento de fraqueza estratégica o Senhor ou algum seu amigo necessitar de serviço de aeroporto em Los Angeles (to and from the motel or hotel), permaneço a sua disposição, com jeitinho brasileiro e tudo.

[28/04/99]

CONDINFO@aol.com wrote: 

Agradeço as suas ponderações mais objetivas. Os seus argumentos são totalmente válidos em relação as suas preferências. Respeito mas não concordo, principalmente quando a maioria dos nossos endereçados, tendo a opção de serem retirados do nosso cadastro, não o fazem. Pelo contrário, a maioria esmagadora, atraída pelo valor do que oferecemos, visita o nosso web site e, numa prova de confiança na idoneidade dos nossos princípios e metas, baixa o nosso demo.
Eles estao com isto lhe dando anuência para continuar se comunicando. É um direito deles de anuir, e seu de comunicar. Nao tenho nada a ver com isso. Estou pedindo por mim. Só teremos problemas se vc nao honrar sua promessa ou se redistribuir meu endereço de email.
Se eu tivesse um mínimo de maldade no que eu faço, por ser também um programador em Assembler, poderia aproveitar esta confiança para inocular qualquer virus de minha preferência; é facílimo, tão fácil que não admito programas de terceiros na minha máquina, tamanho é o meu medo de ser aproveitado para circular um virus. Nem penso nessa possibilidade,  já que para mim, simplesmente pensar nisso já seria um ato imperdoável.  Não optaríamos por divulgar o nosso software pela Internet se o índice de rejeição fosse muito alto, ou se o que temos a oferecer não merecesse os elogios de São Pedro.
Aqui comecam a aparecer as nuanças do problema que lhe escaparam, enquanto defendia seu direito de fazer mass mailing. Estamos todos na ponta de um fio, sujeitos a receber código embusteiro não solicitado em nossas maquinas via SMTP, por que dependemos do protocolo para nos comunicar. No seu caso, vc esta pedindo que eu creia nas suas boas intenções, sendo que nunca nos vimos e sem que eu tenha a menor condição de validar as credenciais e referências que virtualmente me apresenta.

O que torna o teor da sua msg mais confiável que outros spams, para quem nunca viu ou ouviu falar do rementente? (no caso, pode ser um nome fantasia com spoofed source IP injetado, um software-robô, uma empresa, etc). Por que deveria eu confiar em declaracoes de boas intecoes que me chegam em mensagens nao solicitadas, atraves de uma tecnologia vulneravel que nao permite nenhum tipo de autenticacao, por onde faz a festa o mais inusitado zoológico em que está se convertendo a raça humana?

Se eu receber 600 msg por dia com o mesmo teor da sua, qual a chance de alguma delas apresentar falsas auto-declarações de honestidade? Vc e outros afirmam terem algo a perder com a desonestidade, como argumento para me convencer a crer na veracidade de suas declaraçoes de intenção, e eu, por outro lado, estou tentando lhe convencer que tenho algo a perder, se muitos introduzirem na minha maquina de trabalho, mensagens não solicitadas através de uma midia não confiavel e em ambiente de alto risco, todo vez que quiser ler minha correspondencia eletronica, INDEPENDENTEMENTE da pretensa honestidade de propósito em cada uma delas.Vc deve saber que boa parte dos spammers usa a solicitação de retirada de seu nome do cadastro do spammer para "flaguear" a validade do endereço.

Agora aqui surge a pedra angular de nossa discussão: independentemente da eventual corretude e justeza de sua visão, eu NAO QUERO vender nada através mass mailing. Não serei forçado pelos fatos a rever minha crença sobre unsolicited mass mailing se, de repente, todos os marqueteiros_do_custo_ínfimo se tornarem honestos, se todos os hakers descambarem para o bem, se todos os sistemas operacionais se tornarem estaveis e confiáveis, se todos os softwares passarem a exibir mensagens de erro informativas, etc, etc, etc, como no mundo que John Lennon imaginou. E vc, no cenário oposto, gostaria de ter que aceitar os riscos crescentes, investir cada vez mais em tempo, mão de obra, e ferramentas de proteção, para poder conseguir ler e enviar mensagens a seus clientes, se (quase) todos aderirem à prática do mass mailing com listas de endereços coletadas por softwares-robô?

As sociedades precisam examinar cuidadosamente as implicações comerciais da Internet, que são verdadeiramente revolucionárias. A comunicação barata pode ser efetuada em frações de segundos de e para qualquer parte do mundo, a qualquer hora. Me encontro em Los Angeles, nosso servidor está em São Francisco e os clientes em qualquer cidade do Brasil podem receber 24 horas, 7 dias por semana a nossa versão demo, com todas as telas e relatórios inteiramente grátis!

As objeções ao "mass mailing" são muitas. As mais insignificantes (de menor número) são as de cunho pessoal como a sua. As objeções maiores são de cunho econômico. Não me venham convencer com o bla bla blá "anti-ético".

Todos os argumentos que vc apresenta a favor do mass mailing (e por favor, não confunda mass mailing com e-commerce!) se baseiam apenas num principio: de que a conduta humana no mundo de hoje deve se basear apenas por, ou talvez principalmente em, principios economicos. Por isso toma minha petição de princípios como uma objeção de cunho pessoal ou preferência. É claro que eu prefiro viver num mundo mais solidário e responsável, mas isso não é hoje apenas uma preferência -- está se tornando uma NECESSIDADE!

Vou lhe oferecer uma última metáfora, na esperança de conseguir abrandar um pouco a dureza de seu coração em relação à causa que abracei. Spamming é como garimpar ouro usando mercúrio, única forma economicamente viável de lavrar ouro de aluvião em pequena escala. Alguns grimpeiros descobrem ouro de aluvião num rio e proclamam: 

"Estudos científicos comprovam que quantidades ínfimas de mercúrio lançados ao rio como subproduto de uma lavra artesanal de ouro são insignificantes para a ecologia, e portanto, ninguém pode racionalmente me impedir de usar mercúrio para garimpar aqui!". 
Todos concordam rio abaixo, exceto 0,7% de ribeirinhos "facilmente excitáveis", e logo temos um enxume de garimpeiros, como em serra pelada, escavando o rio e lançando suas ínfimas quantidades de mercurio rio abaixo, para logo começarem a surgir as doenças degenarativas incuráveis da poluição do mercúrio em toda a cadeia alimentar da região, até a foz do rio e quem sabe além, como está ocorrendo neste momento, no rio Tapajós, no país dos afáveis macunaimas do qual vc se envergonha. Neste ponto nossa perplexidade é respondida com um convite ao conformismo, ja que, nos dizem, o mundo de hoje opera sob a ideologia do egoismo.

O argumento pode ser usado também para as árvores na floresta (uma árvore não faz falta à floresta, e ningem pode ou irá me impedir de processar ou queimar árvores em minha propriedade, ou de fazer com elas o que bem entender). Meu nariz é minha conexão com a atmosfera do planeta, da qual respiro. Minha conexão PPP é como minha torneira que recebe água do rio IP, do qual bebo informação. Meu endereço de email no seu cadastro é como uma arvore na floresta do seu micro... Nenhum blá blá blá da cartilha neoliberal capitalista, tacanhamente dogmática em seu materialismo irrestrito e inconsequente, me convencerá de que o ser humano constroi um futuro viável rezando por ela.

Os provedores, principalmente os sub-dimensionados e sub-capitalizados, querem veicular apenas os seus anúncios nas suas chamadas, banners etc. Não percebem a sua missão mais ampla de circular informações cuja quantidade é progressivamente exponencial. Não admitem que os seus usuários possam ter interesses comerciais pelo preço da manutenção mensal de suas contas. É infantil, é hipócrita, é irrealista, é um Internauta troglodita, é nocivo quem quer enquadrar os usuários apenas como compradores, negando demagógicamente os seus direitos de anunciar como vendedores os seus bens e serviços
Mas como o marqueteiro_do_custo_ínfimo só conhece o raciocinio através desta cartilha, não consegue ver que, no fundo, toda a polêmica em torno do spam se resume ao direito de uso do endereço de email, e que as legislações anti-spam busca regulamentar a forma como a colheita de endereços de email para o mass mailing pode ser socialmente legitimada. Ele talvez esteja muito atarefado em busca do moto contínuo para se ocupar com essas questiúnculas. O homem inventou o carro para se deslocar mais depressa, e hoje São Paulo exige que a maioria de seus cidadãos enfrentem batalhas diárias de mais de uma hora de casa ao trabalho. Estes cidadãos legitimaram então, como os da cidade do México, restrições à livre circulação de veículos, para deter o colapso da qualidade em seus meios de transporte. A liberdade tem sempre um preço, e nisto consiste -- ou insiste -- o meu bla bla bla.

Como esta sua cartilha proíbe outra lógica, aqueles marqueteiros são incapazes de compreeder outros tipos de argumento, e a estratégia anti-spam mais eficaz termina sendo justamente a de tornar a relação custo/benefício do unsolicited mass mailing  menos atraente, o que faz com que os anti-spammers lhes pareçam falsos moralistas fanáticos, religiosos fundamentalistas destituídos de razão, ou movidos por razões obscuras e egoístas. Reconheço que seus argumentos são sólidos sob sua óptica, mas não reconheço a proclamação da "ditadura da maioria" que consta na introdução de sua cartilha e que vc brande para desqualificar meus argumentos, pois somente eu sou responsável pela minha consciência (também pela minha máquina), e sendo assim, escolhi caminhar pelo mundo sem precisar depender das lentes da ideologia do egoismo, após ter entendido como funcionam.

Não forçamos ninguém a aceitar as nossas opiniões, apenas insistimos no nosso direito de apresentá-las. Todos os argumentos, inclusive os insignificantes, se resumem às condições que  direito de colher.

Enfim, não se preocupe com o seu eMail, ele foi "flagged" no nosso banco de dados como inutilizável para os nossos convites penta estrelados para visitar o nosso web site. Não revendemos a nossa lista, não efetuamos trocas etc. Nos referimos a ela como sendo cinco estrelas porque nos< esforçamos em captar eMails que se enquadram nas categorias que tradicionalmente mostram interesse pelo que temos a oferecer (professores de informática (com louvor), estudantes prestes a entrarem no mercado de< trabalho, administradoras, imobiliárias, SECOVIs, SENACs, SEBRAEs etc).

Atenciosamente,

JRO

PS: As minhas palavras embora incisivas, nem sempre fazem justiça à minha personalidade comunicativa e cordial. NUNCA MAIS lhe convidarei a visitar o nosso web site, mas, se num momento de fraqueza estratégica o Senhor ou algum seu amigo necessitar de serviço de aeroporto em Los Angeles (to and from the motel or hotel), permaneço a sua disposição, com jeitinho brasileiro e tudo.

Por favor, sinta-se tambem a vontade para contactar-me via email por msg pessoal, caso deseje retomar nosso debate sobre liberdade e responsabilidade na internet, seja ou não em um momento de fraqueza ou dúvida ideológica.  ---------------- 
[16/05/99] 

Tomo a oportunidade de solicitar sua anuência para divulgar este nosso debate na página de meu curso. 

[17/05/99] 

Prezado Professor Pedro Antonio Dourado de Rezende, 

Agradeço a sua cortesia em me consultar sobre a divulgação das nossas idéias. Embora seja cortesia, também é desnecessário em relação ao assunto, pois tendo a consciência limpa, sempre assino o meu eMail com nome completo nestes casos. Envio as minhas opiniões não só a usuários como também aos comitês anti-spam, webmaster e outras figuras que a Internet criou. 

Sua idéia de me enviar os resultados é muito boa. Gostaria também de ressaltar que o universo de pesquisa das minhas conclusões é de 5.000+ endereçados. Sumarizo mais uma vez algumas das minhas opiniões a serem ponderadas. 

1) Não temos a intenção de incomodar ninguém com o nosso eMail. Retiramos prontamente quem acredite que esta prática é um atentado para a sua felicidade. 

2) O marketing moderno nunca pediu permissão ao seu público alvo. Por que os provedores se acham no direito de insistir numa exceção?

3) Apenas 0,7% dos nossos endereçados não manifestam nenhuma objeção. A grande maioria aceita esta forma de divulgação, mesmo que passivamente.

4) O nosso software é de alta qualidade e interessa qualquer sociedade em processo de informatização. "Anti-ético" é divulgar pornografia, vicios e produtos mal feitos que procuram enganar o público.

5) Os provedores não tem o direito de decidir pelos seus assinantes. Confiscar eMail é uma prática ditatorial e hedionda, típica de mentes tacanhas e mal informadas.

6) Os verdadeiros motivos dos provedores em lutar contra a divulgação através de eMails é de natureza conômica e não ética, como gostam de afirmar. Os provedores querem a reserva  do monopólio de vender através da Internet usando banners, chamadas, botões etc. Querem maximizar o seu retorno sobre o seu investimento eliminando a livre tramitação de idéias, um forum que a Internet proporciona a nível mundial, a um custo muito accessível, numa velocidade incrível e com penetração geográfica impressionante. Os provedores devem aumentar a capacidade dos seus equipamentos para atender a sua verdadeira demanda.

7) A Internet é um veículo de comunicação revolucionário que ainda não foi bem compreedido pela sociedade. A Internet está alterando as maneiras tradicionais de armazenar e distribuir bens e serviços. Os detentores do capital produtivo precisam se adequar as novas regras do mercado sem impor restrições infantiloides a utilização da Internet. Desta forma, os veículos de marketing tradicionais como a imprensa escrita, precisam aceitar que agora tem que concorrer com uma alternativa mais rápida e barata de divulgação de bens e serviços, acessível também ao micreiro mais modesto.

Atenciosamente, 

Josef R Ozdian 

Art of Programming

[18/5/99] 
Prezado sr, 

Cerca de 2/3 dos alunos da turma 1/99 expressaram opinião de que seus argumentos são mais importantes ou convincentes que os meus. O debate continuou com alguns deles.

[19/5/99] 

2/3?!! Na realidade, os argumentos não são meus, tal como a figura de um círculo não é um círculo. Meu é o software [ snip ]. Meu é o meu bom nome. Minhas são as lembranças que levarei da vida, nada mais... Os "meus" argumentos, tal como a figura que representa um conceito, apenas espelham uma realidade que pesquisei, sem opinião pré-concebida, e em relação à qual decidi tomar alguns riscos com o nosso programa de divulgação. Já sou conhecido de alguns provedores, poucos por sinal mas que deverão aumentar no futuro, como "well known spammer" (na Idade Média este tipo de pessoa terrível certamente seria queimada viva...), justificativa usada para barrar meu acesso tanto de eMail como do nosso web site. Justificativa suficiente para me mandarem uns eMails malcriados. Pensam que são tão eficientes em me combater... No meu banco de dados super organizado e minucioso, pois essa é uma característica minha, anoto todos estes provedores. Não percebem quanto é fácil mudar de "user name", trocar o enderêço do web site, distribuir o envio dos eMails a determinados provedores num espaço de tempo mais amplo, evitando o acúmulo óbvio de um único missivista etc. Com estes recursos simples insisto numa realidade maior que os míopes teimam em negar, num jogo de gato e rato onde eu sou duas vezes mais gato do que o rato; a bem da verdade, macaco velho! Não percebem também um velho truque de marketing: quem procura divulgar adora polêmica para chamar ainda mais atenção. Quando algum cliente nosso reclama que não está conseguindo acesso, lhe explico que existem provedores melhores... E assim a vida continua.

Atenciosamente, 
Josef R Ozdian 
Art of Programming

 

 

Reflexões acerca do debate sobre spam

O professor enviou uma cópia da sua primeira mensagem acima aos alunos da turma 1/99, pedindo aos que se interessassem em acompanhar o debate para se manifestarem.

Conforme citado acima, cerca de dois terços da turma pediu para acompanhar a troca de mensagens do debate, sendo que aproximadamente metade destes opinaram, a maioria (tambem 2/3) manifestando sua preferência pela prevalência dos argumentos a favor dos direitos do internauta emitir correspondência eletrônica não solicitada em massa.

Um dos alunos comentou esta primeira mensagem analizando as premissas que o professor impunha ao debate, em relação aos argumentos que sustentava em aula para expor sua perspectiva sobre segurança na internet. Seu comentário e a resposta seguem abaixo, arrematadas com algumas cosiderações finais do professor.

[04/04/99] 

Antonio Marcelo Alexandre comenta:

Caro prof. Pedro: 

Não imaginei que a não participação na discussão via e-mail tivesse as implicações sugeridas pelo mestre na última aula. Acredito que o assunto é importante, mas a princípio preferia não me expor, talvez por ter opinião oposta à do professor no que se refere a spamming. Como acredito que todo aluno, por mais interessado que seja, tenha a sua componente mercenária quando soam as frases "nota" ou "questão na prova" (preciso tomar mais cuidado com a minha sinceridade), resolvi me fazer mais presente no debate.

Assim como provavelmente o mestre, utilizei a Internet pela primeira vez antes da regulamentação da Internet comercial brasileira. Isso quer dizer que cheguei a conhecer um oceano mais calmo, numa época em que nossas arcas estavam mais a salvo e vazias. Se quiséssemos encher nossas arcas com mais rapidez, tínhamos que usar aquela novidade, o "Mosaic". Propaganda pela Internet era algo raro, e no Brasil, inexistente. Nada de gente tentando invadir as nossas arcas sem a nossa licença. 

Tentar filtrar o mar de informação, separar o trigo do joio, para que não nos percamos em frivolidades, vem se tornando uma tarefa difícil desde então, e acredito que o spamming também entra nesse contexto. Acho que cabe ao internauta rejeitar ou ignorar as mensagens que não lhe são bem-vindas, da mesma forma ele joga fora os folhetos de propaganda que vão parar na sua caixa de correios do mundo da vida (no meu prédio existe até uma latinha de lixo ao lado das caixas de correio para que os moradores tenham o mínimo de trabalho possível).

Tal como o professor afirmou em aula, a Internet não é uma rede de computadores, e sim uma rede de redes, em que pessoas com a qualificação técnica apropriada cooperam tentando definir as regras também técnicas para que a coisa funcione adequadamente. De certa forma, tudo o que se pode ou não se pode fazer na Internet está nas mãos dos autores dos RFC. Isso quer dizer que, a menos que fosse possível (e quem sabe até talvez seja) definir um protocolo que proibisse o spamming, não estaríamos 100% livres dele, exatamente como os senadores americanos não estarão totalmente livres da pornografia e da violência virtuais que querem banir. Acredito, portanto, que o mestre entrou em contradição nesse ponto, ao tentar pregar o anti-spamming.

A Internet migrou, definitivamente, de um ambiente de comunicação e intercâmbio entre pesquisadores para um fenômeno de comunicação de massa, algo parecido com uma TV (só que com a segmentação máxima possível, ou seja, "unicast" em vez de "broadcast"). E assim os hábitos desenvolvidos na rede não estão mais em função daqueles nobres profissionais de ciência, mas sim do cidadão médio comum. Se o cidadão médio comum quiser o "Faustão" domingo à tarde na TV, ele terá. Quem não aceita isso, infelizmente tem que providenciar o seu acesso à TV a cabo ou à Internet 2.

     Peço ao professor que envie os outros mails trocados com o spammer. Quem sabe assim este aluno possa adicionar mais nuances à noção simplista que tem do problema, e quem sabe até tocar a dimensão ética do assunto com mais propriedade. 

Antônio Marcelo

[13/05/99] 

Antonio Marcelo Azevedo Alexandre wrote:

Caro prof. Pedro:

Não imaginei que a não participação na discussão via e-mail tivesse as implicações sugeridas pelo mestre na última aula. Acredito que (2) o assunto é importante, mas a princípio (2.2) preferia não me expor, talvez por ter opinião oposta à do professor no que se refere a spamming. Como acredito que todo aluno, por mais interessado que seja, tenha a sua componente mercenária quando soam as frases "nota" ou "questão na prova" (preciso tomar mais cuidado com a minha sinceridade), resolvi me fazer mais presente no debate.

Assim como provavelmente o mestre, utilizei a Internet pela primeira vez antes da regulamentação da Internet comercial brasileira. 

A rigor não existe nenhuma regulamentação especifica para o comercio via Internet no Brasil, nem algo que possa ser entendido como "internet comercial". O que existe no mundo sobre regulamentação específica para o comércio eletrônico ainda é um cipoal confuso e uma grande discussão juridica sobre a sua necessidade ou não (veja por exemplo, as opiniões do  do prof. Michael Fromkin da Univerdidade de Miami). 

Ocorreu simplesmente que o comercio descobriu a utilidade da internet e o IETF respondeu como pôde, procurando adequar os serviços ao aumento estimado na demanda de trafego, e propondo padrões interoperáveis de segurança computacional, no IPv6. Entretanto o uso comercial da internet se viu, com seu crescimento, em choque com as normas do IETF para regulamentar a distribuição de nomes de dominio para o protocolo DNS, de onde surgem propostas de leis absurdas (porque tecnicamente inexequíveis) no congresso americano, a respeito da autonomia que os organismos cooperativos responsaveis pelo funcionamento da internet podem ter para registrarem e distribuirem nomes de dominio, a respeito das responsabilidades dos administradores de servidores WWW pelo conteudo disponibilizado, e outros disparates propostos por quem não compreende a tecnologia subjacente. (veja discussões nos arquivos do MCG).

Como reação contrária, surge nos EUA legislação que vem sendo aprovada com a ajuda de lobbies de associações de defesa direitos dos cidadãos, principalmente os envolvidos em admistração de redes cooperadas, que consideram abusiva a ação do rolo compressor dos interesses economicos, onde se insere a legislação antispam já aprovada. 

Isso quer dizer que cheguei a conhecer um oceano mais calmo, numa época em que nossas arcas estavam mais a salvo e vazias. Se quiséssemos encher nossas arcas com mais rapidez, tínhamos que usar aquela novidade, o "Mosaic". Propaganda pela Internet era algo raro, e no Brasil, inexistente. Nada de gente tentando invadir as nossas arcas sem a nossa licença.

Tentar filtrar o mar de informação, separar o trigo do joio, para que não nos percamos em frivolidades, vem se tornando uma tarefa difícil desde então, e acredito que o spamming também entra nesse contexto. Acho que cabe ao internauta rejeitar ou ignorar as mensagens que não lhe são bem-vindas, da mesma forma ele joga fora os folhetos de propaganda que vão parar na sua caixa de correios do mundo da vida (no meu prédio existe até uma latinha de lixo ao lado das caixas de correio para que os moradores tenham o mínimo de trabalho possível).

Obviamente concordo que o internauta neste caso não tem alternativa, senão rejeitar ou ignorar. Porem se se descuida, com a caixa de correio que se enche nada mais ocorre, enquanto que do agente POP3 em sua maquina algo pode saltar à CPU e corromper, invadir, infectar, entupir seu disco, etc, inclusive sem deixar rastros. Reconheço que a atitude do destinatário deve ser a mesma em ambos os casos, mas procuro neste debate alertar para a diferença nas consequencias da inépcia do destinatário em lidar, nos dois casos, com a inundação possivel. Esta diferença entretanto, se torna critica quando olharmos um nível acima: o junk mail gera lucros para os correios, enquanto o equivalente virtual gera apenas riscos e custos para o adminsitrador do servidor SMTP de que voce se serve.
Tal como o professor afirmou em aula, a Internet não é uma rede de computadores, e sim uma rede de redes, em que pessoas com a qualificação técnica apropriada cooperam tentando definir as regras também técnicas para que a coisa funcione adequadamente. De certa forma, tudo o que se pode ou não se pode fazer na Internet está nas mãos dos autores dos RFC. Isso quer dizer que, a menos que fosse possível (e quem sabe até talvez seja) definir um protocolo que proibisse o spamming, não estaríamos 100% livres dele, exatamente como os senadores americanos não estarão totalmente livres da pornografia e da violência virtuais que querem banir. 
Reputo como teoricamente impossivel a concepção de um protocolo para troca de mensagens eletrônicas que possa filtrar conteudo semântico com eficácia, além de indesejável na prática, pois seria muito complexo e certamente ineficaz, já que logo seriam descobertas maneiras de se burlar as regras de filtragem, numa corrida sem fim. Não foi isso que sugeri. A filtragem de conteudo só pode ser feita eficazmente nas pontas, por quem usa o protocolo, e não pelo protocolo. Como em todas as aplicações da internet, o segredo do sucesso está na escolha onde localizar a complexidade: esta só dever ser agreagada nas pontas, e é sob esta premissa que se desenrola o debate atual sobre spam, inclusive este.
Acredito, portanto, que o mestre entrou em contradição nesse ponto, ao tentar pregar o anti-spamming.

A Internet migrou, definitivamente, de um ambiente de comunicação e intercâmbio entre pesquisadores para um fenômeno de comunicação de massa, algo parecido com uma TV (só que com a segmentação máxima possível, ou seja, "unicast" em vez de "broadcast").

É difícil entender um fenômeno novo sem o uso de metáforas. Nossa compreensão de fenômenos até então desconhecidos é quase sempre mediada por analogias, e aqui há uma diferença fundamental entre ver a internet como tendo "migrado" para tornar-se um meio unicast, ou ve-la, como julgo mais útil, como tendo se tornado um amplificador quântico não linear, apos ter adquirido certa massa critica: a internet permitiu, permite, e continuará permintindo em dimensões cada vez mais inusitadas, a *interatividade*. Todo o conteudo do texto de Pierre Levy sobre cibercultura gira em torno dos riscos em se usar metáforas pobres para entendê-la, e este debate sobre spam gira todo em torno de questões motivacionais e não técnicas, onde os argumentos  metafóricos apresentados se baseiam em discussões técnicas que pressupõem a interatividade. 

O debate sobre spam é uma batalha por idéias. Ver a internet simplesmente como um meio de transmissão unidirecional significa ignorar o que a internet tem de mais precioso, revolucionário e explosivo, ofuscando-se assim, nesta batalha, a natureza do que se discute. O antispammer sabe que não pode impedir o spamming, mas usa a iteratividade da internet para manter o custo (social e econômico) do spam em um nivel que evite o colapso na qualidade do serviço IP, qualidade pela qual se sente em parte responsável como administrador de rede cooperante e cooperada. 

O antispammer busca meios para fazer com que a sociedade virtual enxergue o custo social embutido no uso "desta midia", quando não se considera o impacto que este uso possa ter em sua qualidade, assim como o adminsitrador público municipal quer que as pessoas no mundo da vida enxerguem o custo social do comercio "informal" (a menos que esteja envolvido em esquema de propina), pois quanto mais comerciantes se tornem camelôs, menos arrecadação de impostos haverá para manter a policia, hospitais e escolas funcionando. É por isso que em algumas sociedades ditas do primeiro mundo, onde as pessoas tem consciencia coletiva mais sedimentada e menos anarquista, o comercio informal é proibido e rigidamente combatido. 

Talvez seja útil revisitar a metáfora em que o sistema imunológico de um corpo vivo é comparado com o que pode ser "segurança na internet", metáfora que mencionei an passant em uma das aulas, para tentar lhe convencer de que a minha pregação anti-spamming, que lhe aparece contraditória em meu discurso, assim lhe parece devido apenas ao choque entre as metáforas que vc e eu estamos usando para entender a internet, e que desaparece se enxergarmos esta rede publica de redes sob uma mesma metáfora, mas uma metáfora que empreste ao conceito de segurança, algum significado razoável. 

Por que afirmo ser a metáfora que escolhi melhor que a sua? 

Primeiro, perceba como é difícil pensar a segurança da internet segundo a metáfora que vc apresenta. Como pode a idéia de uma redes de redes sem dono, onde o que há são hábitos de massa inquestionáveis que a transformam em uma midia unicast, ser conciliada com a idéia da possibilidade de nela termos alguma segurança? esta é uma tarefa árdua até para os sofistas. E por que surge esta dificuldade em sua metáfora? surge da falácia presente na suposta inquestionabilidade dos hábitos de massa "nela desenvolvidos".

Hábitos são seres vivos mutantes, que se alimentam da lei do menor esforço, da preguiça mental, das lentes culturais, das tecnologias, das escalas de valores sociais, que com o tempo envelhecem e perdem sentido mas -- e aqui concordo com vc -- são dificeis de morrer ou serem mortos, como bem sabe o alcoolatra, o drogadito, o motorista de São Paulo ou o neurolinguista. Hábitos são esfinges, guardiãs de nossas cidadelas, que precisamos aprender a decifrar para não sermos por elas devorados. A rede de redes é cooperativa e não tem dono, mas as redes que nela cooperam os têm, e precisam ser adminsitradas por pessoas que, para isso, também desenvolvem hábitos. 

E assim os hábitos desenvolvidos na rede não estão mais em função daqueles nobres profissionais de ciência, mas sim do cidadão médio comum. 
Hábitos surgem através da inteligência e a partir da necessidade ou da conveniência, mas têm vida útil finita, cuja extrapolação cobra um preço daqueles que os praticam. Quem, por exemplo, perpetua hábitos da adolescência na vida adulta, por isso paga em moeda de segregação ou desajuste social. Ao migrar do mundo da vida para o mundo virtual, o hábito publicitário da mala direta encontra um ambiente distinto, onde o custo da panfletagem é em grande parte trasferido do marqueteiro para a estrutura de serviços de que se servem marqueteiros e destinatários, e onde quem arcar com este custo terá, com certeza, algo a dizer ou fazer a respeito. 

 Na metáfora que escolhi, é ético abandonar a suposição de que devo respeitar a idade dos hábitos marqueteiros (que agora se virtualizam, e que vc confunde com novos habitos "desenvolvidos na rede") e pensar nos hábitos que posso desenvolver, para controlar custos que porventura recaiam sobre o meu trabalho de administrar redes, a ser pago para a sobrevida de hábitos alheios, arcaicos e mal ajustados. Antes que em mim se tornasse hábito pensar no mundo virtual como existindo apenas para servir aos nobres profissionais de ciência, fui levado ao hábito de pensar sobre como desenvolver novos hábitos de sobrevivencia profissional neste mundo virtual, hábitos cuja falta alijará do mercado administradores de rede sem competência para manter servidores WWW e SMTP no ar, e cujo exercício contribuirá coletivamente para a qualidade global dos serviços viabilizados pela internet. 

Se o cidadão médio comum quiser o "Faustão" domingo à tarde na TV, ele terá. Quem não aceita isso, infelizmente tem que providenciar o seu acesso à TV a cabo ou à Internet 2.
Ou simplesmente sintonizar outro canal ou desligar a televisão, como nos tempos do Chacrinha, em que não havia internet nem TV a cabo. Hoje, felizmente, tenho a opção adicional de carregar o browser e clicar numa sequencia infindável de "canais" interessantes, sem precisar esperar que o lixo velho surja na ponta do fio azul, misturado ao lixo novo. Não sintonizar o Faustão ou frivolidades semelhantes, ou me recusar a participar de suas brincadeiras, caso suas cameras me cerquem na rua ou tentem entrar na minha casa, é algo bem diferente de tentar banir o gordo global do campo eletromagnético do planeta. Quero apenas bani-lo do espaço vibratório que alcance meus olhos e ouvidos, pouco me importando para o tamanho da sua audiencia ou da sua conta bancária, reservando-me o direito de assim proceder, mesmo vivendo numa sociedade onde a maioria acredita na ditatura da maioria. Antes de ser a ditadura da maioria, a democracia deve ser o estado de direito pelo respeito às minorias. 

Vou repetir o argumento em outro cenário, já que não tive muito sucesso em fazer-me claro antes a respeito do argumento da ditatura da maioria: longe de querer banir a bundinha, eu simplesmente não quero jogar fora meus discos do Chico Buarque, do Milton Nascimento e do Caetano Veloso, só porque a bundinha é hoje ubíqua e uníssona nos musicais da TV. 

Estamos no contexto de um curso de Segurança de Dados, onde é dever do professor estimular seus alunos à reflexão sobre a natureza de trabalho que escolheram, que poderá eventualmente incluir a árdua tarefa de manter nossos servidores WWW e SMTP no ar, para o bem ou para o mal. A voces, devo convencer que pode ser mais útil enxergar, no cibercenário atual, o alimento dos habitos mutantes de uma sociedade atônita, do que fatos inquestionáveis que encerram verdades pétreas inscritas a fogo na lei dos tempos. Já é tempo de mudarem o hábito de se buscar, antes de tudo, aquilo a que se tem direito -- proprio aos jovens, aos hedonistas e aos spammers -- para cultivarem o hábito de, antes, avaliar as responsabilidades implicitas nos compromissos que se assume -- próprio à prudência madura e ao profissional que conhece o alcance de sua competencia. 

O administrador de redes está condenado a ser sempre mal compreendido pelo cidadão_médio_comum_que_quer_o_Faustão_domingo_a_tarde, mas que quer também ler seu email ao toque do mouse e se sente importante com a bajulação marqueteira dos spammers. O administrador é incompreendido pois é forçado, por exigencia de sua profissão, a decifrar, à frente de quem os pratica, habitos humanos que tangem o mundo virtual. Os usuários nas platéias dos Faustões da vida dificilmente entenderão seu nível de paranóia ou a escala que emprega para interpretar a equação de Nemeth, até se tornarem eles mesmos adminstradores de uma rede cooperante (Evi Nemeth disse: segurança = 1/conveniencia). Com tal responsabilidade sobre os ombros, eles eventualmente aprendem a usar o poder iterativo da internet para evitar a desintegração da qualidade do serviço pelo qual se sintam co-responsáveis, e a ponderar o uso de seu discernimento frente ao comportamento de manada a que somos, todos, obrigados a reagir. 

Peço ao professor que envie os outros mails trocados com o spammer. Quem sabe assim este aluno possa adicionar mais nuances à noção simplista que tem do problema, e quem sabe até tocar a dimensão ética do assunto com mais propriedade.
O fenômeno antispamming no mundo de hoje, bem como o da indústria antivirus ou o da industria de segurança computacional interativa, pode ser entendido, sob a premissa de que a internet é fundamentalmente um fenomeno de comunicação interativa, como análogo a uma reação imunológica perante um processo de crescimento desordenado, tais como o são as infecões e neoplasias (cancer) em um organismo vivo. Considere para isso as seguintes comparações:  No organismo, nenhuma célula controla todas as outras, mas todas cooperam. 

Certas células e anticorpos (proteinas) são usadas pelo organismo para sua proteção como um todo. O maior desafio do sistema imunologico consiste na tarefa de identificar a presença de material expúrio ou nocivo ao organismo (virus, bacteria, toxinas, celulas cancerosas). Algumas células (os fagocitos) são responsaveis por detectar mateiral suspeito, desassemblando-os e liberando na corrente sanguinea, fragmentos rotulados (os anticorpos) que serão identificados através dos rótulos por outras células (os leucocitos), responsáveis pela fabricação de antígenos específicos, que combaterão seletivamente os corpos contendo tais fragmentos, identificados como indesejáveis. As células cancerosas são celulas cuja reprodução e especialização fugiu de seu proprio controle, e geralmente apresentam evidencia proteica deste descontrole. Num organismo sadio, tais focos de crescimento surgem espontaneamente ou por invasão, mas seu crescimento é neutralizado pelo sistema imunológico, que desempenha sua função com eficacia suficiente para atingir equilíbrio antes do colapso do organismo.

Existem programas que se conectam recurisvamente a endereços IP, para reconhecer e copiar strings cuja sintaxe indique um endereço de email. Estes programas constroem listas de email para mass mailing. Estes programas e listas são comercializados, vendidos para marqueteiros que querem a todo custo minimizar o custo publicitário per capita de acesso ao "público alvo" (eles mesmos assim nomeiam). Existem scripts que automatizam todo o processo de spamming, e existem "empresarios" que vendem o serviço completo de direct emailing para audiências monstruosas a preços módicos: basta enviar ao empresário a msg que se quer distribuir, escolher o perfil e tamanho da audiencia, e pagar (antecipadamente). A execução de tais scripts sobrecarrega ao limite, durante o tempo em que durar, o servidor SMTP onde executam. 

Existem provedores que, para buscar oferecer serviço ininterrupto a todos os seus assinantes, e/ou para evitar serem associados no mundo da vida a esquemas fraudulentos, impõem cláusulas impeditivas ao mass mailing no contrato de prestação do serviço que oferecem a seus assinantes. Existem spammers ocasionais (guacamole spammers) que abrem contas diferentes em vários destes provedores com dados pessoais de laranjas, onde cada conta é planejada para ser usada em cada execução de script (single spamhit accouunts). Existem spammers invisíveis (relay spammers) que buscam pelo ciberespaço servidores SMTP mal configurados, para de lá rodarem seus scripts e para onde apontarão depois centenas de milhares de endereços de origem. O administrador deste servidor SMTP não saberá identificar o spammer e receberá todo o calor das reações ao spamhit. Nos grupos de discussão sobre spam (spamlists), que existem também no Brasil, administradores trocam informações sobre spammers para coordenar ações que diminuam a eficácia das estratégias do abacate e da desova (onde o spammer escorrega pelos dedos ou some na ciberfumaça).

Alguns sites permitem o mass mailing consentido, onde os enderecos destinatários teriam previamente concordado explicitamente em receber email comercial não solicitado, pois a coleta de endereços consentidos não apresenta as caracteristicas exponenciais de amplificação quântica que tornam o fenômeno spam equivalente à neoplasia. As listas consentidas são (talvez por isso) bem mais caras, e os spammers em geral não estão interessados em obedecer a esta restrição, que consideram pentelhice absurda. 

Provedores que são identificados pelos antispammers como coniventes ou insensíveis ao potencial danoso da prática irrestrita do mass mailing (spamhavens), são denunciados nas spamlists e ameaçados de terem seu tráfego filtrado na entrada das redes dos participantes, de preferência aqueles que lhes vendem acesso. Os renitentes tem seu tráfego filtrado, e todos seus usuários se ressentem eventualmente da visibilidade parcial do ciberespaço sendo-lhes oferecida. Esta estratégia é muito mais eficaz do que se perseguir a aplicação de leis conflitantes em um territorio sem fronteiras, e tanto mais eficaz quanto mais próximo ao spamhaven, na topologia interdomínio, for introduzida a filtragem do seu tráfego. A ação antispam corresponde assim à componente de filtragem exponencial local do amplificador quântico que é a internet (esta metáfora supõe que a internet só poderá continuar crescendo ordenadamente se o crescimento exponencial for não-localizado).

Sob o filtro semântico implícito na metáfora da midia unicast, os participantes das spamlists aparecem como fanáticos nazistas que abusam do poder quando o detêm e violam o direito dos internautas se comunicarem. Sob o filtro semântico implícito na metáfora do amplificador quântico dotado de filtros que se comportam como um sistema imunológico, os participantes das spamlists aparecem como fagócitos e leucócitos voluntários que reconhecem, assumem e exercem, inclusive em beneficio profissional próprio, seus papéis de co-responsabilidade pela qualidade do mundo virtual que estamos construindo. Até onde sei, estas duas metáforas são hoje as mais usadas para se entender o fenômeno internet. 

Escolha, pois, bem escolhida a sua metáfora, construa a sua própria se quiser, mas reconheça que sua compreensão sobre spaming estará sendo mediada por um filtro semântico, pois o fenomeno é novo e seu status como ação social ainda não está por isso sedimentado.

Considerações finais sobre os debates


Bibliografia



 
 

Editado por Pedro Rezende. Atualizado em Março de 2000.