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O impasse na Votação do Marco Civil da Internet

Entrevista ao prof. Nelson Pretto, da FACED-UFBA,
  Para matéria na Revista da SBPC
Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência

Prof. Pedro Antonio Dourado de Rezende
Departamento de Ciência da Computação
Universidade de Brasília
05 de novembro de 2013


(fonte original)

Nelson Pretto: 1- Qual a importância do marco civil da internet para o Brasil e para o mundo?
Pedro Rezende:  O marco civil foi uma iniciativa que nasceu da tentativa de para parar o processo de aprovação do AI Digital, a Lei Azeredo e a ideia é ter uma contra partida, um pano de fundo para o qual qualquer tentativa de criminalizar condutas na internet tivesse um anteparo que limitasse isso em torno de direitos fundamentais de quem usa a internet e obrigações de quem presta serviços. Foi uma iniciativa pioneira que serviu de modelo para o mundo, mas bateu de frente com interesses de se apoderar da internet como instrumento de controle social ou instrumento de negócio para grandes empresas de comunicação.
NP: 2- Que forças estão emperrando esse projeto??
PR: Numa sociedade capitalista fala mais alto o poder do dinheiro. Enquanto era o poder da internet a participação popular na elaboração do projeto de lei foi intensa, quando chegou na casa legislativa onde o poder do dinheiro fala mais alto os obstáculos surgiram, basicamente em dois pontos: para manter o modelo de negócios hierarquizados, obsoletos de distribuição de conteúdo de obra autoral, centrado na cobrança por cópia, de acesso por cópia, a indústria do copyright, leia-se as empresas de telecomunicação tradicionais, queriam  passar o custo de combater a violação ao regime de negócio delas para o estado, a sociedade. Então, a tentativa de colocar o poder de polícia nos operadores de tecnologia, provedores de serviço, para sem interferência do judiciário tirar do ar conteúdos supostamente lesivos aos interesses dessas empresas, dos distribuidores de material protegido por direito autoral. E também as empresas de telecomunicação que querem poder diferenciar o tráfego pra vender acesso a internet como um serviço parecido como se fosse TV a cabo.

A neutralidade da rede tem um aspecto técnico e jurídico. O aspecto técnico é o seguinte, pra que as empresas de provimento de acesso a internet possam fazer a sua parte para que a internet funcione não é necessário que elas saibam exatamente para que a comunicação entre dois computadores na internet está acontecendo se é para um serviço de acesso à página, se é para correio eletrônico, se é para telefonia, vídeo conferência. Para que o serviço funcione não há necessidade de quem é dono de um cabo ou de um roteador saber exatamente para que aqueles bytes vão ser usados, como que eles vão ser interpretados. Essa é neutralidade técnica que permite que o operador da Cia de telefonia deixe passar pacotes na sua rede sem discriminar em relação a origem,em relação ao negócio de quem está mandando ou recebendo simplesmente por uma estratégia de tentar encontrar o melhor caminho para que os dados saiam do lugar de origem e cheguem no lugar de destino.

Do ponto de vista técnico, a internet funciona com uma estrutura em camadas, cada camada funciona com uma lógica, independente do que está acontecendo na camada seguinte. Então é possível operar o serviço de acesso a internet sem necessidade de interferir na lógica das aplicações.
Do ponto de vista jurídico é o direito de quem está acessando a internet de não ter o seu acesso, aquilo que ele vai fazer, discriminado em relação a qual é a origem, qual o destino, qual a natureza do serviço. O que as empresas de tele estão tentando é impedir que uma lei permita a elas violar a capacidade técnica que mantém ... o que elas querem é poder interferir , a pretexto de dar qualidade de sinal nas transmissões com vídeo, por ex, eles querem ter o direito de interferir na fila de quais pacotes saem primeiro, com isso eles ganham o poder de estrangular tráfegos que não interessam  ao negócio deles. O risco é de uma grande concentração, que torna a internet em algo parecido com o serviço de TV a cabo.
NP: 3- Se o marco civil ceder a essas pressões será o fim da internet?
PR: Será o fim da internet como conhecemos hoje. A internet tem algo de inusitado, peculiar, ela é ao mesmo tem uma rede que permite liberdade de comunicação para os como nunca houve antes para os indivíduos e ao mesmo tempo um instrumento de controle social também como nunca houve antes na história da nossa civilização. Tudo isso ao mesmo tempo. Então, a cara que a internet terá no futuro depende dessas batalhas, inclusive normativas, não só no plano jurídico, mas também de padrões técnicos, discussões de consórcios pra elaborar padrões que vão constituir a linguagem de comunicação entre programas da internet.

O Brasil está atrasado tecnologicamente em relação a ter uma estratégia de defender sua soberania. Como o direito autoral deve evoluir na internet o país é pioneiro. São aqueles que querem dominar o fluxo da informação na sociedade moderna, pois para eles isso é poder de distribuir conhecimento, formar opinião pública. Então tudo isso está em jogo.
NP: 4- Construção de data centers?
PR: Só para o governo, não faz sentido fazer o Google construir um data Center aqui. Mas para o governo é uma opção estratégica importante, não como solução geral.

Assista o restante da entrevista no vídeo linkado acima