Num arrebatamento de fúria burocratizante, o governo federal editou, no dia 28 de junho, a medida provisória nº 2.220/01, conhecida como "MP dos Cartórios Virtuais". Tendendo para o ucasse, um daqueles decretos czaristas, a medida joga no lixo os projetos sobre o assunto que tramitam no Congresso Nacional e determina uma centralização absurda.Em todo o mundo, o crescente uso de documentos e de transações eletrônicas exige formas de fiscalização. Ora, as pessoas e as empresas transacionam cada vez mais pela internet, as movimentações bancárias on-line são uma realidade e os próprios atos do poder público estão sendo agilizados pelo uso do meio eletrônico. Busca-se, então, assegurar a integridade, a autenticidade e a validade jurídica dos documentos produzidos eletronicamente. Alguns modos de certificação que indicam um bom caminho a seguir já são usados na rede de computadores. Caracterizam-se pela pulverização do controle, o que dá à sociedade maior responsabilidade e segurança sobre seu uso. Propostas em discussão no Parlamento também acatam esse princípio, mais razoável.
Só que, se obedecido o modelo da MP, um todo-poderoso Comitê Gestor da ICP-Brasil (Infra-Estrutura de Chaves Públicas) vai controlar as empresas certificadoras dos documentos. Serão sete membros representantes do governo e quatro da sociedade civil -nomeados ao bel-prazer do presidente da República. Além disso, eles serão assessorados e receberão apoio técnico de um organismo ligado à Agência Brasileira de Inteligência. O efeito prático é que todos os documentos emitidos de forma eletrônica ficam sujeitos às disposições do comitê, o que vai contra as experiências internacionais e as propostas discutidas no Congresso.
Abre-se a porta para a formação de um "Grande Irmão", como o descrito por George Orwell. Pois muito pouco impediria o governo de controlar cadastros e transações privadas. A oposição à MP foi iniciada pela OAB. O mínimo a exigir é que a sociedade civil seja ouvida e que a discussão se dê no Congresso.