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Passos da(na) mídia para(contra) um golpe militar

O caso na Turquia em 2016

Prof. Pedro Antonio Dourado de Rezende
Departamento de Ciência da Computação
Universidade deBrasília
Julho de 2016


Entre 15 e 26 de julho de 2016 o autor manteve, numa lista de emails dedicada à segurança digital, uma intensa troca de mensagens tentando entender o que estava acontecendo na Turquia. Ao vivo, em pleno desenrolar do golpe militar que lá acontecia, esta sequência de mensagens -- aqui editada em forma de quase debate -- revela como os fluxos de informação, desinformação e contrainformação desempenham papel crucial para o sucesso ou fracasso de golpes de Estado hoje. E mostra como as premissas de confiança que cada um precisa utilizar para classificar transmissões numa dessas categorias podem falhar catastroficamente. Com possíveis efeitos desastrosos para quem venha a tomar parte, voluntariamente ou não, em tais golpes. A lição aqui é que nossos referenciais de confiança devem ser reavaliados frequentemente, e em momentos de crise, constantemente. Como a lista é fechada, alguma edição foi necessária: autores respondidos são identificados por iniciais; [texto entre colchetes] são insertos que visam a preservar o sentido original do conteúdo postado, e elipses ... são supressões convenientes a esta edição.

 


email 1:

2016 Julho 15 18:35 (BRT), EM

Um golpe militar está em andamento neste exato momento da Turquia. Quais as possíveis consequências para o cenário internacional já tão volátil?


> Um golpe militar está em andamento neste exato momento da Turquia...
email 2:
2016 Julho 15 18:48 (BRT), WS

Acabei de ver aqui em Moscou!!!! Pro-OTAN ou pro-Russia?



> Acabei de ver aqui em Moscou!!!! Pro OTAN ou pro Russia?
email 3:
2016 Julho 15 18:54 (BRT), EM

Como a mídia russa está cobrindo o acontecimento? Parece que o exercíto grego está em alerta.



> Como a mídia russa está cobrindo o acontecimento?...
email 4:
2016 Julho 15 19:03 (BRT), WS

Apenas repetindo o que aconteceu! Não apareceu ninguém pra falar, apenas um comunicado de John Kerry [secretário de Estado dos EUA], que por acaso (??) esta aqui em Moscou! Está recente ainda!

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... email 5:
2016 Julho 15 19:07 (BRT), KG

"Alemanha rejeita voo de Erdogan" (notícia das 18h:56min):
A MSNBC disse que a Alemanha negou autorização para que o avião de Erdogan aterrizasse em seu território.

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... email 6:
2016 Julho 15 19:07 (BRT), IO

Isso explica alguns pontos: "The Final Stage of Erdogan's Takedown - BFP Eyeopener" (youtube, dezembro 2015)

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... email 7:
2016 Julho 15 19:17 (BRT), AM

Comentário:
As coisas estão esquentando, e parece que Erdogan cantou sua última canção. Essa tentativa de golpe surge depois de uma virada dramática nas relações turco-russas, nas duas últimas semanas, com Erdogan revertendo sua posição ao revelar que a Turquia passará a cooperar com a Rússia contra o estado islâmico na Síria e no Iraque. E agora isso. A Turquia moderna (a partir do séc. XX) já sofreu vários golpes militares. Um grande escândalo irrompeu quando Erdogan assumiu o poder, revelando a existência de uma rede secreta de operadores do 'projeto Gladio', conhecidos como "Ergenekon' na Turquia, quem efetivamente por trás das sombras manda no estado em favor das potencias ocidentais.

A questão é se esse golpe foi provocado pela recente mudança de atitude de Erdogan em relação à Rússia e Síria. Como escreveu Joe Quinn ano passado sobre o incidente com o avião militar russo, as estruturas militares e civis de inteligência turcas são basicamente montadas e controladas pela OTAN e pela operação Gladio. Interessenta que apenas dois dias antes do golpe a França fechou sua embaixada em Istambul alegando "preocupações com a segurança". Veremos...



> Acabei de ver aqui em Moscou!!!! Pro OTAN ou pro Russia?
email 8:
2016 Julho 15 19:52 (BRT), AM

Está parecendo pró OTAN.



> Isso explica alguns pontos: ...
email 9:
2016 Julho 15 20:05 (BRT), EM

Bem outra proxy war, mas essa pode sair fora do controle...



> ... Está parecendo pró OTAN.
email 10:
2016 Julho 15 21:31 (BRT), Pedro Rezende

Dentre os seis aliados de Magog em Ez 37-38, tres são nomeados por patriarcas cujas tribos em tempos remotos povoaram regiões do território atual da turquia: Meshech, Tubal e Togarmah. Fico então inclinado a acreditar que a atual turquia eventualmente se desintegrará, com tres das divisões se alinhando ao que hoje parece estar se consolidando com união eurasiana (inclui a China e o Irã -- que em Ez 37-38 contribui como um dos outros três aliados dirigidos de Gog)

Lembremos que na primeira guerra que poderia ser corretamente chamada de mundial -- a " Guerra dos Sete Anos" (travada em quatro continentes entre os anos de 1756 e 1763), na primeira metade o império britânico quase perdeu, mas a partir de 1759 conseguiu virar o jogo e terminou a guerra se consolidando como a nova potência mundial, e hegemônica.
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email 11:
2016 Julho 15 21:53 (BRT), Pedro Rezende

Alguém (que porventura também esteja tentando, ou venha tentar) consegue conectar com o streaming ao vivo da RT News? Gostaria de saber se o tráfego IP de mídias alternativas já começou a ser bloqueado no Brasil (minha operadora é a OI, que está em concordata). O URL é https://www.rt.com/on-air


> Alguém consegue conectar com o streaming ao vivo da RT News? ...
email 12:
2016 Julho 15 21:59:31 (BRT), EM .

Acabei de testar eu também estou tendo dificuldades de acessar o seviço da RT News. Não é o único...


> Bem outra proxy war, mas essa pode sair fora do controle...
email 13:
2016 Julho 16 04:17 (BRT), WS .

10 da manhã aqui em Moscou! Parece que acabou a tentativa de golpe! Aparentemente a coisa foi menor do que pareceu! Nas imagens aqui, soldados se rendendo, apanhando da população e sendo "rebocados" pela policia! Outra questão eh que também aparentemente a motivação era dar suporte ao discurso de um líder religioso que nem mora na Turquia! Entretanto, um analista afirma que há suporte "islâmico" para isso e que mais coisas virão!!


> Bem outra proxy war, mas essa pode sair fora do controle...
email 14:
2016 Julho 16 09:18:33 (BRT), GB .

Minha impressão de ordem zero é que o Erdogan apoiava ISIS secretamente embora condicionalmente se ligasse a OTAN. Os russos devem ter engrossado com ele a partir do caso do avião derrubado e as ferrovias petroleiras do ISIS utilizando o porto da Turquia. O desagrado OTAN e da Rússia devem ter sido fatores de desestabilização muito fortes.


> Alguém consegue conectar com o streaming ao vivo da RT News? ...
email 15:
2016 Julho 16 10:13 (BRT), RF .

Pedro, existe alguma determinação oficial para este tipo de bloqueio?


> Pedro, existe alguma determinação oficial para este tipo de bloqueio?
email 16:
2016 Julho 16 10:29 (BRT), Pedro Rezende

Que eu saiba, tal determinação não é prevista em lei vigente. Mas o serviço já voltou. Pode ter sido apenas falha técnica do próprio site, mas na ocasião isto me pareceu muita coincidência.


> ... O desagrado da OTAN e da Rússia devem ter sido fatores de desestabilização muito fortes.
email 17:
2016 Julho 16 11:16 (BRT), Pedro Rezende

Uma análise mais aprofundada desse múltiplo desagrado acaba de ser publicada pelo analista geopolítico Ulson Gunnar, no portal New Eastern Outlook, que termina assim (com minha tradução):

A participação continuada da Turquia nas tentativas lideradas pelos EUA de "regime change" na Síria tem tido custos político e econômico altos para a Turquia, com vários ataque terroristas em seu próprio território praticados alegadamente pelos mesmos grupos que a Turquia vem apoiando na Síria. A nação está claramente pagando um preço em termos de segurança e estabilidade.

Para facções dentro das Forças Armadas da Turquia, encarregadas da defesa e autopreservação do Estado Turco, deve ser tentador intervir para reverter essa trajetória desastrosa. Deve ser tentador também para o governo do presidente Erdogan antecipar-se a essas intervenções. E para o governo dos EUA, que tem se beneficiado muito da cooperação da Turquia contra a Síria, deve ser tentador assegurar que o governo turco permaneça nesse curso, ou mesmo que acelere seu envolvimento e expanda seus esforços.

A ausência de qualquer figura política significativa se apresentando como líder ou para liderar o golpe deu margem a especulações sobre possibilidades para origem e autoria. A primeira, de que a fação que lançou o golpe, o fez como meio para testar sua viabilidade e arregimentar maior apoio baseado na percepção inicial de seu sucesso. A segunda possibilidade, é a de que essa tentativa de golpe foi uma manobra ardilosa, não para ser bem sucedida, mas, como em vários ataques terroristas recentes na Turquia, com o objetivo justificar uma maior consolidação do poder presidencial de Erdogan. E a terceira, é a de que o golpe foi mesmo organizado de fora por Fetulah Gulen, como meio de pressionar e coagir o presidente Erdogan a aprofundar o envolvimento turco nos ataques à Síria.

É preciso notar que um pouco antes do golpe o presidente Erdogan passou a tentar reparar as relações com os governos da Rússia e da Síria, depois de ter conduzido a Turquia beira da guerra com ambas nações. Para entendermos as consequências, temos que considerar a possibilidade das facções militares envolvidas no golpe continuarem subvertendo, resistindo ou tentando derrubar o atual governo turco, mesmo tendo o golpe fracassado. É preciso também lembrar que a minoria Curda vem travando um conflito de baixa intensidade com o governo turco há vários anos, e que esse conflito se intensifiou nos últimos cinco anos com a guerra na vizinha Síria

Se o golpe foi mesmo liderado por comandantes militares cerceados ou desprestigiados, eles podem se tornar a longo prazo um potente fator desestabilizador numa região envolta em complexas lutas militares e políticas. Se o presidente Erdogan depois redobrar sua aposta na derrubada do presidente sírio sob a liderança militar norteamericana, tendo consolidado seu poder na Turquia às custas da influência dos militares no governo, então esse golpe mal executado parecerá uma artimanha do próprio Erdogan para aprofundar o envolvimento do seu país no caminho destrutivo da guerra contra a Síria, que vem trilhando desde 2011. Enquanto a mídia corporativa ocidental vem tentando retratar o fracasso aparente do golpe como uma "vitória para a democracia", parece claro que a desarticulação do Estado turco nos últimos anos não beneficiará ninguém, nenhuma instituição ou princípio político, inclusive a própria democracia.

Acho que Gunnar está com o faro afinado.
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> ... O desagrado da OTAN e da Rússia devem ter sido fatores de desestabilização muito fortes.
email 18:
2016 Julho 16 12:23 (BRT), Pedro Rezende

Sinais que corroboram a segunda possibilidade aventada por Gunnar (na msg anterior) começam a emergir: por exemplo, nesta matéria do portal Zero Hedge


> Sinais que corroboram a segunda possibilidade aventada por Gunnar (autogolpe para consolidar mais poder) começam a emergir ...
email 19:
2016 Julho 16 17:49 (BRT), RW

Lendo uma matéria no site do Aljazeera encontrei este trecho:

Ex-presidente turco Abdullah Gul disse à CNN turca que "a Turquia não é uma pais latinoamericano ... chamo aqueles que tentam derrubar o governo para que voltem para seus quartéis"

Lamentável!



> ... "a Turquia não é uma pais latinoamericano ... " Lamentável
email 20:
2016 Julho 16 18:55 (BRT), Pedro Rezende:

Entendo que este lamento seja a respeito da situação nossa (cuja cultura política se vê perpetuamente como colônia), e não sobre a da turquia (cuja qual ainda sonha com a grandeza multicentenária do império otomano, que ruiu faz cem anos pela mão dos impérios britânico, francês e russo). E para complicar o desafio de eventuais interessados em contra-contragolpe na turquia, sinais de que a origem do golpe tenha sido a terceira possibilidade aventada por Gunnar (organizado por Fetulah Gulen com apoio da CIA), ou de que esta terceira servirá de camuflagem para a segunda no contragolpe, e/ou de pretexto, barganha ou biombo para reversão de alinhamento geopolítico via reaproximação com a rússia, estão agora sendo emitidos em rápida sucessão (p. ex. dois artigos no portal Zero Hedge, [1] e [2]):

Biombo que se encaixa bem no contexto, haja vista as mais recentes e importantes decisões do perseguido califa: E para dar mais realismo a esta complicação, traduzo um comentário que foi postado junto à matéria [1] acima (cujo teor desconhecia e cujas fontes não consigo rastrear), com liame para a matéria [2], que também se encaixando direitinho no suposto plano dos globalistas financeiros para instalação de um governo tirânico global (sob o guante neurolinguístico uma emergente religão apóstata mundial): o "gullenismo"

De uma olhada nessa reportagem sobre o encontro da OTAN em Varsóvia -- Erdogan foi ignorado por Obama e isso tem a ber com os objetivos de [Hillary Clinton] em Washington. Deu no portal "Político": A 'bomba' prestes a explodir é a longa e intrincada relação entre Fetulah Gullen e os Clintons (Bill e Hillary). Gulen é um dos maiores doadores para a Fundação Clinton. Gulen e seus associados também deram grandes contribuições financeiras para a campanha presidencial da Hillary em 2008 e 2016, o que provocou demandas dos republicanos, não atendidas, para que devolvessem doações. Gulen recebeu favores do Departamento de Estado comandado por Hillary e Bill, que rendem frequentes homenagens a Gulen, a última em setembro (2015)

Os Clintons estão até o fio dos cabelos comprometidos com Gulen e com os gulenistas, e sua organização parece dedicar-se ao tipo de operação clandestina que os Clinton cultivaram em Honduras e na Líbia. A real questão que será respondida antes de novembro (2016) é se Gulen esteve ou não tramando o golpe com o aparelho paraestatal dos Clinton



> ... "a Turquia não é uma pais latinoamericano ... " Lamentável
email 21:
2016 Julho 16 19:25 (BRT), JR

Negociar com terrorista ou qualquer tipo de marginal ou bandido é como dar carona para o escorpião atravessar o rio. Assim que ele vê que já se salvou ele vai te picar. Não é maldade, safadeza ou traição, é apenas a natureza do escorpião. Vejam o que está acontecendo na nossa república. Capos de máfia (empresários) confiaram em pessoas corruptíveis (políticos e servidores públicos e assemelhados) que se juntaram a gerentes de quadrilhas (doleiros, traficantes de drogas, Gestores públicos, diretores de estatais). Combinaram o assalto ao banco (tesouro nacional). Os governo estrangeiros (Tio Sam e seus 5 olhos) viram a grande oportunidade de acabar com a única companhia de petróleo que o incomoda do lado de baixo do equador por sua capacidade de pesquisa (Petrobras). Identificaram um juiz com fama de zorro (Moro) e alguns jovens idealistas (MP e PF) que poderiam fazer o trabalho. Aproveitando o escândalo do mensalão agentes da CIA plantaram na mão dos paladinos uma nova lei anti corrupção que permite prender os capos (empresários). Existem muitos outros interesses e Covert operations. Quem viver e analisar Verá que foi assim que chegamos até aqui. Não existem amizades entre nações ou mesmo cooperação internacional, apenas interesses.



> Negociar com terrorista ou qualquer tipo de marginal ou bandido é como dar carona para o escorpião atravessar o rio...
email 22:
2016 Julho 18 15:22:16 (BRT), Pedro Rezende

Duas mensagens atrás eu havia replicado um comentário alheio sobre o suposto papel (ativo ou passivo) de um certo Fetulah Gulen no golpe de 15/7/16 na Turquia, com a ressalva de não haver conseguido rastrear o assunto. Bem, agora sim, com a ajuda de outro comentrio -- este cheio de links -- de um leitor da primeira matéria a respeito publicada pelo analista militar de codinome The Saker. A coisa parece grande, séria, e adensa a ofuscação entre as possibilidades 2 (autogolpe para consolidar mais poder) e 3 (golpe organizado por Fetulah Gulen com apoio da CIA). Transcrevo abaixo uma tradução de trechos desse comentário:

Sobre GULEN: Depois do golpe, Erdogan pede aos EUA extradição de Gulen

Erdogan parece ter decidido desafiar o ocidente a a União Européia após ter sido esnobado por Merkel e os demais líderes europeus. Kerry acaba de ter uma reunião de emergência na Rússia (onde estava no momento do golpe). O ocidente teria feito um último esforço para derrubar Erdogan mas a Rússia teria lhe alertado a respeito e por isso ele estava preparado quando o golpe aconteceu: convenientemente a bordo de seu avião particular, voando (na madrugada) para longe da confusão. O ocidente perdeu, com a Rússia e a Turquia prestes a formar uma nova aliança, extremamente importante para os russos. A Turquia como parceira significa uma frente unida contra as forças militares da OTAN e da Europa (na Síria). Uma cartada ganhadora: se esse golpe fracassou por isso, e essa nova aliança se formar, o ocidente terá mostrado suas cartas e terá sido trucado pela Rússia. O confronto entre ambos com a derrubada do avião militar russo terá sido uma armadilha para forçar uma maior aproximação da Turquia com o ocidente, que fracassou.

Sobre marginais e bandidos, o presidente da Rússia expressou uma opinião interessante durante sua participação na decisiva Conferência sobre Segurança Global de Munique em 2007: a de que as relações internacionais são muito parecidas com a Matemática. "Não há nada de pessoal sobre elas" (em 1m24s). Aguardemos então os próximos capítulos, para os desdobramentos no golpe em curso aqui.


> ... Negociar com terrorista ou qualquer tipo de marginal ou bandido é como dar carona para o escorpião atravessar o rio
email 23:
2016 Julho 18 16:49 (BRT), GB

Na linha do Erdogan de acender uma vela para a OTAN e outro para os fanáticos muçulmanos; entrou o outro fanático Gulen para tentar terminar o estado laico turco e chutar o Erdogan fora. Os russos foram espertos e manobraram o já desorientado Erdogan. Tenho a impressão que o Erdogan será eliminado de algum modo por algum fanático pois estaria emperrando todos os planos religiosos.



> Na linha do Erdogan de acender uma vela para a OTAN e outro para os fanáticos muçulmanos ... Tenho a impressão que o Erdogan será eliminado ... pois estaria emperrando todos os planos religiosos.
email 24:
2016 Julho 18 15:22:16 (BRT), Pedro Rezende

Não só planos religiosos (hegemônicos), também os geopolíticos (basta seguir os links). No mais, não acredito que Erdogan esteja desorientado (exceto talvez por sua excessiva ambição), quiçá errático (para quem tem visão geopolítica curta), pois vem agindo conforme um cálculo político racional, conforme a lógica dissecada por Pepe Escobar em artigo no portal The Saker.

Esta sua impressão todavia coincide com opiniões bem fornidas, como por exemplo a de Sibel Edmonds, uma analista iraniana ex-tradutora da CIA que virou denunciante, que parece mais articulada na mídia alternativa, e que mostra a escala da aposta feita pelos candidatos ao comando do emergente hegemon no movimento desse Gulen, em entrevista concedida ao blogueiro geopolítico james Corbett. Pelo visto essa aposta não será retratada, considerando o dano colateral em desmoralização que adviria do investimento em publicidade oficiosa já feito na mídia corporativa, como por exemplo nessa matéria do Business Insider em 2013: “The Political Future Of Turkey May Be Decided On This Quiet Road In Rural Pennsylvania”, da qual um comentarista anônimo no portal The Saker destaca as seguintes falas, que traduzo:

Antes mesmo de começar o ano d 2014, a situação na Turquia já parecia instável. Pela primeira vez o país conduzia eleições diretas para a presidência, com ampla especulação de que o então primeiro-ministro Recep Erdogan concorreria para estender seu poder além dos limites daquele cargo. Erdogan passou dez anos como primeiro-ministro e doze como chefe do partido religioso de direita Justiça e Desenvolvimento (AK), onde sua liderança foi abalada por sérios protestos antigoverno em Istambul no início deste ano (2016).

Entretanto, analistas acreditam que essa mais recente ameaça não vem de dentro da Turquia. Parece que vem do interior da Pensilvânia. 1857 Mt. Eaton Road, Saylorsburg, PA, para ser preciso. Esse endreço secluso é conhecido como a residência de Fetulah Gulen, um enigmático clérigo muçulmano que vive em autoimposto exílio da Turquia desde 1999.

Gulen e seus influentes seguidores na Turquia, que incluem membros das Forças de Segurança e do Judiciário, apoiaram Erdogan em três sucessivas eleições. Entretanto, recentemente, tem havido sinais de que essa coalisão informal estava se desmoronando, o que viria a ser um grande problema para Erdogan na próxima eleição. Hum, quem sabe um golpe antes da próxima eleição?

Alguns dizem que essa alegada ruptura ocorreu porque gulenistas se aborreceram com uma possível transição ao conservadorismo no partido que Erdogan lidera (AK). Outros dizem que a perseguição promovida por Erdogan contra as escolas fundadas pelo movimento gulenista provocaram essa retaliação. Parece que o plano era escalar Gulen para ser o próximo líder da Turquia com Erdogan sendo excluido por meios outros que não uma eleição. Como Gulen alega misturar Islã e negócios, ele parece um bom candidato a vassalo para os EUA.

Outro sinal intrigante, talvez sintomático de quanta água ainda irá rolar por baixo dessa ponte no Bósforo, é o silêncio até aqui do Vaticano (parceiro de Gulen em mirabolantes "planos religiosos"). Quem quiser entender o papel da Turquia na geopolítica global deve conhecer o papel do Vaticano no projeto de formação desse país, após a desintegração do império Otomano na chamada Primeira Guerra Mundial, e na sua guinada inicial para o Ocidente, projeto este que parece ter sido a maior vítima desse "golpe preliminar". Para tal entendimento, uma rica fonte seria o autor de um livro sobre o milenar conflito entre o Vaticano e a Igreja Ortodoxa, Avro Manhattan, do qual ele publicou recentemente um resumo na web.


> 10 da manhã [do dia 16 de julho] aqui em Moscou! Parece que acabou a tentativa de golpe! ... Entretanto, um analista afirma que há suporte "islâmico" para isso e que mais coisas virão!!
email 25:
2016 Julho 18 21:47 (BRT), Pedro Rezende

Dois artigos que aprofundam a análise que vem sendo contemplada nessa thread desde então: O primeiro, de Brandon Turbeville, sob a perspectiva norteamericana, considerando uma quarta possibilidade -- além das três elencadas inicialmente por Gunnar (citadas no email 17) --, que decifraria a ofuscação de sinais até agora apontando tanto para a 2ª quanto para a 3ª possibilidades, ofuscação que vem me intrigando até aqui. O segundo artigo, de Ghassan Kadi, sob a perspectiva russa, considerando um possível envolvimento ou influência do Kremlin, mesmo que indireta.


> Está parecendo pró-OTAN.
email 26:
2016 Julho 20 18:14 (BRT), Pedro Rezende

Hoje a radio Super95 de NY publicou matéria afirmando que vários meios de comunicação árabes estão citando "fontes diplomáticas de Ankara" que revelam que o MIT (serviço de inteligencia do governo turco) foi alertado do iminente golpe pelo serviço de inteligência russa, cerca de cinco horas antes de iniciado. Os diplomatas não identificados teriam dito que o exército russo na região havia interceptado os comunicações militares altamente sensíveis (mensagens de rádio codificadas) que mostravam que no exército turco haviam preparações para se deflagrar um golpe contra o governo em Ankara. Essas incluíam ordens para o envio de vários helicópteros do exército ao hotel onde o presidente Erdogan estava passando férias, para prende-lo ou mata-lo.

Os diplomatas não tinham certeza da estação russa que teria interceptado as trocas, mas disseram que a unidade de inteligência do exército russo implantada em Khmeimim (também chamado Hmeimim) na província de Lattakia ao norte da Síria, é declaradamente equipada com o estado da arte eletrônica para espionagem de sistemas para coleta de informações altamente sensíveis, como parte da missão anti-terrorismo na Síria. Há um mes eu havia aqui postado, respondendo a um pedido de opinião (na thread "attibution is hard"), um alerta baseado numa análise do comunicado da OTAN, então recém-divulgado, que estabelece doutrina para classificar doravante "ataques cibernéticos" como atos bélicos enquadráveis no artigo V do respectivo tratado (cláusula de obrigação de defesa mútua).

Meu alerta destacava a escalada insana no contexto desse comunicado, talhado para que os sheeples percebam tal doutrina como "reação" à (psyop que pinta) o governo russo (antes era o chinês!) como responsável por seguidas "invasões", como à do site do Democratic National Convention (Guccifer 2.0), mas minha resposta foi recebida ou com indiferença, ou com charmoso desdém em meio a mais artilharia de links da mesma psyop. Muito bem, se as informações da matéria de hoje da Super95 forem verdadeiras, tendo em vista a atual artilharia na mídia corporativa para explicar" o golpe turco como ataque de bandeira falsa -- curioso, eu diria até divertido, ver a mídia corporativa sendo obrigada a admitir que ataques de bandeira falsa *existem*, atingindo com fogo cruzado seu precioso meme de enquadrar críticos da narrativa oficial como paranóicos conspiracionistas --, como fica a tal doutrina neste caso?

Considerando que uma das cláusulas obrigatórias para permanência na OTAN é a prática do regime democrático, um ataque cibernético de um estado não-membro que quebra a cifragem de comunicações militares para a derrubada do governo eleito de um estado membro, seria enquadrável na clausula V? Mas se for, teria que ser contra o estado não-membro com contra a própria OTAN? Sendo a tal notícia verdadeira, tudo indica que devemos aguardar pelo plano B. Pelo golpe 2.0, que começa por preparativos, de desconstrução psico-midiática do sobrevivente governo (o qual, ao longo do aborto do golpe 1.0, na boca das tardias autoridades da OTAN era -- ainda -- o "legítimo democráticamente eleito"). Desconstrução que já começou na mídia e nas agências de avaliação de risco financeiro.

Pedindo permissão, e perdão antecipado pelo comentário, parece que essa guerra está cada vez mais surreal (exatamente como descrita em Mt 24)


> Hoje a radio Super95 de NY publicou matéria afirmando que ...
email 27:
2016 Julho 20 22:52 (BRT), EM

Parece que teremos mais surpresas logo então. Entretanto, não muito boas.



> Está parecendo pró-OTAN.
email 28:
2016 Julho 20 23:35 (BRT), Pedro Rezende

De fato. Essa doutrina atual de guerra não-convencional, sendo executada por psicopatas que já se acham no comando do emergente hegemon, parece estar finalmente enfrentando seu primeiro teste realista com o povo da Turquia, cuja alma não é de colono (veja comentário no email 20). Citando um comentarista do portal Katehon:

O fato de quase todo o alto comando militar do exército não ter apoiado a rebelião evidencia a formação de uma aliança entre Erdogan e os kemalistas, onde a geopolítica cumpre importante papel. A geopolítica joga um importante papel nessa formação. Os gulenistas certamente tentaram arregimentar o apoio do nacionalismo secular turco, deixando de lado as diferenças sobre políticas internas, mas a geopolítica se mostrou mais importante (sobre as três correntes políticas em cena na Turquia, veja o primeiro artigo citado no email 25)

É significativo que, nesta situação, o povo turco em sua quase totalidade passa a apoiar o até então impopular Erdogan, porque seus oponentes trazem com eles o inevitável fim da Turquia como país soberano e independente. Como traz qualquer um que nesta situação trabalhe contra os interesses nacionais, em favor de uma hegemonia moribunda imposta dos EUA.



> Essa doutrina atual de guerra não-convencional, sendo executada por psicopatas que já se acham no comando do emergente hegemon, parece estar finalmente enfrentando seu primeiro teste realista ...
email 29:
2016 Julho 21 09:48 (BRT), JC

Chega a ser uma piada, um país vizinho intercepta comunicações da Força Armada de outro, e faz uso da informação para obtenção de "lucro" próprio a seu bem querer. Isso de forma oficiosa. Pelo que está escrito, estando correto, a comunicação turca foi e é interceptada e decifrada por outro país. Será que o Erdogan vai entender esse procedimento como protecionismo ou intromissão?



> Chega a ser uma piada, um país vizinho intercepta comunicações da Força Armada de outro ...
email 30:
2016 Julho 21 09:54 (BRT), EH

Meu ponto de vista é que nada do que aconteceu é estranho, ou não pertence ao jogo que todos jogam. Pode ser que países ou organismos se posicionem, mas será a arenga hipócrita de sempre.



> Chega a ser uma piada, um país vizinho intercepta comunicações da Força Armada de outro, e faz uso da informação para obtenção de "lucro" próprio a seu bem querer
email 31:
2016 Julho 21 23:35 (BRT), Pedro Rezende

Acho que a piada aí -- de mau gosto, porque macabra -- está nos psicopatas que se acham já no comando do emergente hegemon, acharem também que esse tipo de procedimento é prerrogativa tecnológica exclusiva deles, por meio de suas agencias de tres letras.
> Isso de forma oficiosa. Pelo que está escrito, estando correto, a comunicação turca foi e é interceptada e decifrada por outro país. Será que o Erdogan vai entender esse procedimento como protecionismo ou intromissão?
Parece-me óbvio que Erdogan entendeu, sim, como protecionismo e intromissão esse procedimento específico (de interceptação e decifragem, pela FA russa, de comunicações da facção golpista da FA turca), mas *não* como repudiáveis, já que aquilo que o compartilhamento das comunicações interceptadas protegia eram o seu governo eleito e interesses potencialmente comuns a ambos (principalmente, a inversão de alinhamento geopolítico do primeiro).

Doutro lado -- embora ainda não possamos saber disso pela mídia corporativa, até porque o terremoto geopolítico provocado pelo aborto do golpe 1.0 ainda está fluindo--, parece-me que Erdogan entendeu como protecionismo e intromissão, também, o procedimento que as comunicações interceptadas tramavam (preparação do golpe 1.0, com envolvimento do organismo internacional alojado militarmente em seu território), *estes sim* como repudiáveis, haja vista a situação atual desse alojamento, ainda bloqueado para tráfego terrestre de qualquer tipo (inclusive de energia elétrica)

Também me parece óbvio o porquê do blackout da mídia corporativa ocidental sobre esse bloqueio, que já dura seis dias: Se o governo da turquia for publicamente pressionado para "liberar" a base militar desse organismo internacional instalada em território turco, antes que se esclareça o grau de seu envolvimento no golpe 1.0 contra o governo turco, essa pressão poderia facilitar, no front psicológico, ao governo turco inverter seu alinhamento geopolítico, alistando a opinião pública do seu país para a opção de deixar a posição de bucha de canhão do Ocidente, rumo a um arranjo multipolar onde o país viesse a integrar a aliança de defesa alternativa, a Shangai Cooperation Organization (SCO).
> Será que os organismos internacionais irão se posicionar?
O ONU já se posicionou, permitindo a damas como Angela Merkel e Dilma Rousseff espernearem no púlpito de suas assembléias gerais pós Snowden. Erdogan não é bem uma dama, mas... A ONU Já se posicionou também -- nisso de forma militarmente séria, através das resoluções 2249 e 2254 do seu Conselho de Segurança --condenando inequivocamente todos bandos terroristas infiltrados na Síria, e portanto legitimando a aniquilação dos mesmos, os quais vem sendo clandestinamente sustentados pela organização alojada militarmente na Turquia, com aporte de outros governos da região e com participação e "lucro" do governo turco (enquanto tal arranjo lhe convém), ao mesmo tempo em que fingem -- com a cumplicidade da mídia corporativa -- estarem se metendo no país vizinho para combater o (que nomeiam) terrorismo.

Uma tal inversão do alinhamento geopolítico da Turquia viabilizaria o cumprimento das citadas Resoluções do Conselho de Segurança da ONU, ao mesmo tempo em que inviabilizaria essa hipócrita estratégia para destruição do governo e da nação Síria como soberana; enquanto o sucesso de um golpe com características até aqui reveladas, vice-versa. Assim, a hipocrisia na narrativa oficial vai atingindo níveis surreais, com vários ataque de bandeira falsa, sejam verdadeiras ou falsas mesmo, digna das profecias bíblicas sobre os últimos dias desta era, como em Mt 24.


> ... Pode ser que países ou organismos se posicionem, mas será a arenga hipócrita de sempre.
email 32:
2016 Julho 25 10:28 (BRT), Pedro Rezende

Considrando organismos que praticam jornalismo independente, alternativo e com fontes abertas (open source), posicionamentos vêm fluindo:

> [nos primeiros momentos do golpe] A MSNBC disse que a Alemanha negou autorização para que o avião de Erdogan aterrizasse em seu território.
email 33:
2016 Julho 26 12:57 (BRT), Pedro Rezende

Quer nome melhor que "Conspiração" para isso?




Editor e co-autor

Pedro Antonio Dourado de Rezende é professor concursado no Departamento de Ciência da Com­putação da Universidade de Brasília, Advanced to Candidacy a PhD pela Universidade da Cali­fornia em Berkeley. Membro do Conselho do Ins­tituto Brasileiro de Política e Direito de In­formática, ex-membro do Conselho da Fundação Softwa­re Li­vre América Latina, e do Comitê Gestor da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-BR). http://www.­pedro.jmrezende.com.br/sd.php

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