Existe
um conceito jurídico chamado liberdade de
associação, que em muitas constituições
modernas é protegida. Recentemente, observamos uma
prática que exercita essa liberdade de uma forma, digamos,
peculiar.
1- Algumas pessoas vem praticando atos em associação com o nome "Anonymous";
2- A esse nome se atribui o sentido de identificar um coletivo, digamos, virtual ou digital;
3- A alguns desses atos -- mas não a todos -- pode-se atribuir a
tipificação de crime, segundo leis vigentes.
Pelo que entendo, Anonymous é tão somente um nym coletivo. Um nome,
cujo significado -- decorrente das formas em que vem sendo usado para
se referir a terceiros -- tem aglutinado a acepção de identificar um
coletivo digital.
Existem algumas contas em redes sociais abertas com esse nome. No
espaço dessas contas, os que se inscrevem -- seja com nome civil,
pseudônimo ou
nym -- discutem ideias e ações.
Ideias associadas a uma proto-filosofia que visa a explorar o valor e a
praticidade do anonimato como instrumento para manifestação e/ou ação
política numa sociedade caracterizada por hiperconectividade e
desintegração dos meios de sustento à privacidade. E ações que ponham
em prática tais ideias, visando alguma ação ou manifestação específica.
As lideranças, quando surgem no espaço dessas contas, são casuais e
efêmeras, emergindo a partir de algum grau de consenso sobre a forma de
se executar algum plano de ação ou manifestação específica.
Daí, nada impede qualquer um, com nome civil verdadeiro ou
falso, com
pseudônimo falso, ou com nym recorrente -- como por exemplo, em
manifestações físicas com a máscara de Guy
Fawkes (imagem ao lado) --, de abrir outra conta ou de
promover ação associada a este nome com o objetivo de
valorar tal ação
pela
associação com outras ações executadas
sob o mesmo nome, sem o
conhecimento ou anuência dos que de fato executaram tais outras
ações. Ou, alternativamente também, para
denegrir essas outras ações.
Enfim, quem vem usando esse nome para se referir a si mesmo, está,
nisso também, testando na prática as ideias daquela proto-filosofia.
Noutras palavras, "Anonymous" é um fenômeno semiológico possível nesse
tipo de sociedade.
Escrevo da Arena do 5° Campus Party no Anhembi, onde vim participar
da mesa redonda "
Ciberativismo Político: Separando o Joio do
Trigo." Enquanto aguardo o debate, leio o manifesto do Partido Pirata
do Brasil, aqui distribuído. E enquanto leio, penso nos comentários e
opiniões que tenho visto com frequência na mídia
corportativa, e por aí sobre o tema: os crimes dos Anonymous.
E ponho-me a refletir: já que ninguém sabe quem são essas
pessoas, seria menos presunçoso dizer que existem criminosos
entre os Anonynous.
Pois doutra feita, assim como os atos tipificáveis que
são praticados em associação com o nome são
crimes, mesmo que indeterminados (enquanto a autoria estiver encoberta
pelo anonimato decorrente da associação com o nome
Anonymous apenas), a atribuição de autoria de crime
à mera prática de qualquer ato sob tal
associação também é crime: ou de
calúnia, ou de difamação, ou de injúria. Os
dois primeiros também indeterminados, por não identificar
os praticantes de atos que não são tipificáveis
enquanto lhes atribui autoria de algum crime.
Seja por atribuir falsamente a praticantes de atos não
tipificáveis sob tal associação a autoria de atos
tipificáveis sob a mesma associação (como se
"Anonymous" fosse um nome que identificasse uma pessoa): Calúnia
Seja por atribuir falsamente a praticantes de atos não
tipificáveis sob tal associação a autoria de
outros atos que são tipificáveis (sem identificar tais
outros atos), ou por aludir como crime a mera associação
com tal nome (falsamente, onde a liberdade de associação
é protegida): Difamação.
Seja por denegrir a reputação e a honra de eventuais
praticantes de atos apenas não tipificáveis sob tal
associação, onde esta for protegida por direito: Injúria
O que eu vejo como peculiar nessa prática, é que ela tem
um efeito didático, ao incitar os incomodados a cometer eles mesmos crimes, ao
menos de injúria.
A lição, aqui, é que a fúria legiferante
dos fanáticos do controle, que promove a nova corrida do
ouro-de-tolo alquímico, com a radicalização normativa pela proteção cada vez mais rigorosa de
construtos de propriedade imaterial cada vez mais esotéricos,
tem um preço. Do tipo feitiço-contra-feiticeiro.
Em tempo: para que esta reflexão não seja confundida com
idolatria dessa prática ou de seus praticantes,
cumpre-me esclarecer que não tenho ídolos.
Não idolatro nem mesmo a razão ou a racionalidade, como
prescreve o arquétipo do cientista moderno, muito menos ao deus
Mamon, como prescreve a ideologia neoliberal. Eu tenho um Senhor, Jesus
Cristo.
Minha visão metafísica sobre essa questão toda
é bem simples, profética e anti-humanista: o ser humano
não será capaz de salvar a si mesmo daquilo que
está no final dos caminhos que trilha por si. Por
mais que tente, ou por mais que pareça ir na
direção correta.
Valores, posições e interesses antagônicos
estão inextricavelmente entrelaçados na ciberguerra, que,
ao final desses caminhos, convergirá com as guerras convencionais. Nessa marcha, os que hoje parecem ser
meus ídolos, amanhã poderão parecer ser meus
demônios, conforme sejam usados pelo Criador na execução de Seu plano para a História.
O joio só pode ser separado do trigo após a colheita. E a
colheita virá quando Deus entrar em julgamento da humanidade.
Conforme profetizado por Jesus Cristo em Mateus 24.